Ministros do STF se pronunciam a Mendonça sobre confecção de dossiê: Ai, ai, ai, que feio! Não faça mais isto!

21 de agosto de 2020, 16:12

Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) mandaram um severo recado ao ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, depois de examinarem a questão do dossiê que levantou “vida pessoal, escolhas pessoais ou políticas e práticas cívicas exercidas por opositores ao governo”. O recado foi de fato muito duro: “Ai, ai, ai, que feio! Não faça mais isto!”

Todos nós temos motivos de sobra para acreditar que os ministros do STF tiveram acesso ao dossiê de nove páginas que reuniu informações sobre quase 600 policiais, professores e “formadores de opinião”, como definiram, no “documento”, as figuras públicas que dele constam tais como o ex-ministro Paulo Sérgio Pinheiro e o antropólogo e ex-secretário de Segurança do Estado do Rio de Janeiro, Luiz Eduardo Soares.

Para chegarem ao placar de 9 X 1 e à conclusão de que não foi Mendonça o autor da “encomenda” sobre o monitoramento da vida dessas pessoas, é de se supor que os membros da suprema corte se certificaram, solicitando ao Ministério da Justiça, a cópia do pedido emitida pelo ex-ministro Sergio Moro, da confecção de tal arapongagem. Certamente eles emitiram os seus pareceres com base em prova documental. Do contrário, seria apenas suposição e cremos, piamente, que a mais alta corte do país não trabalhe apenas com suposições ou “convicções” (prática de Deltan Dallagnol), mas com documentação de fonte primária, colhida a pedido deles, para ser inserida nos autos.

Partindo do princípio que eles têm em mãos o pedido do ministro demissionário, para a confecção do dossiê, não ficou clara a motivação de Moro – de quem todos nós temos motivos de sobra para desconfiar de práticas pouco democráticas e límpidas -, para mandar fazê-lo. Mas neste caso, está confusa a explicação para o objetivo do pedido. Ainda que lembrássemos o pito de Bolsonaro, aos berros, no dia 22 de abril, quanto à eficiência dos seus serviços de inteligência, não seria razoável que Moro, já de saída e limpando as gavetas, solicitasse dos funcionários da nebulosa Secretaria de Operações Integradas (Seopi) do Ministério da Justiça, que começassem naquele dia um trabalho de espionagem. Tudo bem que a Secretaria foi criada por Moro, no dia 19 de janeiro de 2019, (assim que ocupou a cadeira no governo que se iniciava), mas quando os subordinados lhe entregariam o trabalho concluído? E para quê? Que uso Moro faria desse dossiê, estando fora do governo?

Com estas questões a serem respondidas, convém também nos perguntarmos, por que o ministro Mendonça, terrivelmente evangélico, um temente a Deus, conhecedor dos 10 Mandamentos,  onde o oitavo deles diz claramente:  Não levantar falsos testemunhos (nem de qualquer outro modo faltar à verdade ou difamar o próximo), teria dado prosseguimento ao trabalho do qual disse publicamente discordar? Na ocasião em que o dossiê veio à luz, pelo site Uol, chegou a declarar: “Não admito perseguição a grupo de qualquer natureza”.

Cabem ainda, perguntas tais como: por que o ministro Mendonça tentou negar a existência do documento que acabou tendo que entregar aos membros do Supremo? Por que demitiu o diretor de Inteligência da Seopi, coronel do Exército Gilson Libório de Oliveira Mendes?

Botando fé em que tudo foi devidamente esmiuçado pelos membros do STF, antes de proferirem o veredicto acima, resta a pergunta que não quer calar: a quem interessa saber quais são os opositores do governo Bolsonaro? (Este foi o motivo alegado para a preparação do relatório). Ou, melhor, reformulando: de que cor era o cavalo branco de Napoleão? Ops! Quer dizer: o que os berros de Bolsonaro, na reunião de 22 de abril, têm a ver com o dossiê elaborado dentro da Seopi por este ou aquele titular? Será que não convém dar uma olhadinha no terceiro andar do Palácio do Planalto?

Escrito por:

Jornalista. Passou pelos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora-pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" e "Imaculada", membro do Jornalistas pela Democracia

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *