Claudio “Chiqui” Tapia, presidente da AFA, beija a taça do mundo argentina

Argentina perdeu o “Papa portenho”, mas está no comando da FIFA. A desmoralização da CBF combina com a entronização da AFA, todos farinha do mesmo saco. Mas tem alpiste farto para todos

19 de maio de 2025, 20:33

Se o mundo é uma bola, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) é uma bola de ferro, as chamadas algemas de pés, dessas que, até um tempo atrás, adornavam as canelas de presos perigosos. Não vamos chamar ninguém aqui de corrupto, imagina, só contar fatos. Dos últimos presidentes da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), cinco foram presos ou afastados. Numa BET, você acertará na aposta se vier a pergunta sobre o próximo. Na última quinta-feira (15), Ednaldo Rodrigues- o homem que contratou, no último respiro, o italiano Carlo Ancelotti, até então treinador do Real Madrid, como técnico da seleção brasileira – foi afastado de seu cargo. A decisão da Justiça foi motivada pela falsificação da assinatura de um dos vice-presidentes da entidade, em um documento que, na prática, mantinha Ednaldo, o breve, na presidência da CBF. Ednaldo já avisou que vai para casa até que a bola de ferro o alcance. O interventor Fernando Sarney – sim, claro, filho do ex-presidente José Sarney, eleito pela Amapá – já marcou novas eleições para 25 deste mês. As cartas já estão marcadas: Samir Xaud, presidente eleito da Federação de Roraima – você leu direito – que nunca dirigiu nada no futebol nem na várzea -, será eleito para comandar a CBF de 2025 a 2029, com Copa e tudo no meio, já que será candidato único.

Potência futebolística: Samir Xaud, atual da Federação Roraimense – interino, nem assumiu -, será o único candidato à presidência da CBF. Entende mais de medicina – aliás, é médico – que de futebol.

Você tem o direito de perguntar: existe futebol em Roraima? Claro, preconceituosos! São 10 clubes – o futebol era amador até 1974: Roraima, Náutico, Monte Roraima, Sampaio, Rio Negro, Progesso, São Raimundo, River, Baré e Real – e ninguém passa da série D. O São Raimundo ocupa a melhor posição, segundo o ranking da CBF, e está na 77º colocação. Ah, o pai de Samir manjava do futebol local, tendo dirigido por 40 anos a FRF. Explica a casta, filho de cartola, mas não explica a escolha. Ou explica? Porque Samir Xaud? Pergunte para a CBF.

Ednaldo Rodrigues, o presidente afastado, e o interventor Fernando Sarney, sim, filho do autor de “Marimbondos de Fogo”

Com isso, Ednaldo, o breve, foi destituído também, por unanimidade, do Conselho da Federação Internacional de Futebol. O curioso é ver como o futebol sul-americano não é uma caixinha de surpesas, mas um clube de amigos, tipo futebol society entre parças barrigudos. Pequenas máfias. Máfia no bom sentido, uma coisa meio “Família Soprano”, não pensem em “Os Bons Companheiros”. O polêmico – vamos usar palavras leves aqui – Claudio ‘Chiqui’ Tapia, presidente da Associação do Futebol Argentino (AFA), ocupará este cargo no board da FIFA, ao menos interinamente. A AFA, siamesa da CBF, vive encalacrada, sendo o último perrengue um escândalo de manipulação de resultados. Entidade que esteve muito tempo, na mesma época de Teixeira, na CBF, comandada por “Dom Julio”, ou Julio Grondona. Dispensa apresentações.

Julio Grondona e Ricardo Teixeira: os dois homens poderosos com a mão forte na Argentina e no Brasil

O Conselho da Fifa é composto por 37 membros, um presidente eleito em Congresso, oito vices e outros 28 integrantes eleitos pelas federações. O antigo mandatário brasileiro era um dos representantes do órgão que toma decisões importantes para os rumos do futebol no mundo. Que é coisa nossa: a FIFA foi comandada, entre 1974 e 1998, pelo brasileiro João Havelange, ex-nadador e jogador de water polo, que presidiu a Fifa em um período de expansão do futebol no mundo, mas encerrou a carreira, como seus colegas da CBF, de forma melancólica. Envolvido em vários escândalos, inclusive junto com seu ex-genro, Ricardo Teixeira, ex-presidente da CBF, afastado da arena pública. Havelange foi acusado de receber propinas pela venda de direitos de mídia de torneios da FIFA e aceitar milhões de dólares da agência de marketing esportivo suíça ISL (International Sport and Leisure) para que a empresa fosse a única com contrato com a Fifa. Morreu, então respeitem. Claro, tudo maldade.

Além de Teixeira, cartola que ficou mais de 20 anos à frente da CBF, antes de ser banido pela FIFA em caso de suborno, experimentaram a mesma fama José Maria Marin, preso em 2015 pelo FBI na Suíça, no caso que ficou conhecido como “Fifagate”, Marco Polo Del Nero, Rogério Caboclo, acusado de assédio sexual e moral, e, agora, Ednaldo Rodrigues. Haja grilhões.

“Chiqui” Tapia tem, pelo menos um quadro para emoldurar e colocar na parede de casa – e nem falo do poster da Seleção Argentina, última campeã do Copa do Mundo. O presidente da Argentina, Javier Milei personagem frequente no futebol local – como todo ditador populista- tirou sarro, recentemente, do comandante do futebol argentino. Milei simplesmente tentou impedir que as eleições da federação acontecessem em outubro do ano passado. Em suas redes sociais, o presidente da Argentina atacou Tapia ao publicar uma charge ironizando o atual comandante da AFA. Essa aqui mesmo.

Charge de Cristian Dzwonik, Nik, cartunista argentino conhecido por desenhar para o diário La Nación -repostada pelo presidente Milei

“AFA sim ou AFA não?”, pergunta em repórter magérrimo – só somos assim como estagiários, tá – no cartoon. “Eu afano (roubo) sempre”, responde o personagem de Tapia, num trocadilho lamentável. Para completar a charge, um gato chama o presidente da AFA de “Cheque Tapia”. Apesar de toda a polêmica, Cláudio “Chiqui” – ou cheque – Tapia foi reeleito presidente da AFA durante a assembleia. Com isso, serão 12 anos no poder. Tapia assumiu a presidência da Associação de Futebol Argentina em 17 de março de 2017. Três anos depois, foi reeleito pela primeira vez durante a pandemia, o que obrigou a realização de uma assembleia virtual. Apesar de toda a polêmica, foi reeleito presidente da AFA durante a assembleia. O novo mandato começa em 2025 e vai até 2029. Com esses 12 anos- e o que mais vier – “Chiqui” terá, no mínimo, o mesmo tempo que o papa argentino ficou no comando da Igreja Católica.

Escrito por:

Jornalista há 40 anos, já foi repórter e editor nos maiores veículos do país - o Globo, Jornal do Brasil, Folha de S.Paulo, Correio Braziliense, Istoé - assessor de imprensa, analista sênior de informações e/ou ex-diretor de agências de comunicação corporativa - FSB Comunicação, Santafé Ideias, In.Pacto -, ex-professor de Jornalismo da PUC-RJ, trabalhou no Senado Federal e na Prefeitura do Rio. Premiado, entre outros, com Prêmio Esso, Embratel e Herzog.