Mulheres das Forças Armadas Brasileiras: STM

Presidente do STM se diz preocupada com o aumento de abusos sexuais nas FAs

5 de maio de 2025, 12:19

Desde que em janeiro deste ano o Exército Brasileiro abriu alistamento voluntário para as jovens de 18 anos, a chegada desse contingente às fileiras da instituição tem sido motivo de preocupação. Isto porque tem se observado um aumento de casos de assédio sexual nas Forças Armadas em geral.

O problema foi tratado nesta semana, pela ministra Maria Elizabeth Rocha, do Supremo Tribunal Militar (STM), em palestra na Ouvidoria da Justiça Militar, em Belo Horizonte, onde foi convidada a falar sobre “O combate à violência de gênero: As instâncias Correicionais do Superior Tribunal Militar na Relativização das Interseccionalidades Contemporâneas”. Elizabeth Rocha exibiu números, de fato, inquietantes, e justificou a sua apreensão lembrando “o inegável aumento das mulheres nas Forças Armadas brasileiras, fenômeno potencializado com o advento do alistamento para o serviço militar feminino, em janeiro, quando 23 mil mulheres se inscreveram no processo seletivo em um único mês”. 

Outro que já havia externado preocupação sobre esse aumento de casos foi o Procurador-Geral de Justiça Militar, Clauro Roberto de Bortolli, em entrevista ao “Denise Assis Convida” de 13 de abril. Na conversa ele também mencionou o aumento dos processos dessa natureza. 

Na exposição da ministra, ela citou o exemplo, fornecido durante a 11ª Conferência Internacional sobre Capacitação do Poder Judiciário, em Seul, na Coréia do Sul, pela juíza auditora Natascha Maldonado. Segundo a juíza, dentre os crimes de natureza sexual mais recorrentes na Justiça Militar da União, entre janeiro de 2021 e agosto de 2024, 3% foram de violação de recato; 14% eram de estupro; 34% diziam respeito a assédio sexual; e 49% retratavam importunação sexual.

A magistrada também mencionou pesquisa realizada nas Forças Armadas, ainda em 2021, na qual se constatou que, a despeito do número ainda reduzido de mulheres na caserna, em 78% dos casos as vítimas eram do gênero feminino. E para reforçar as informações trazidas a público, forneceu um dado: “apenas 6% do contingente do Exército é formado por mulheres. Na Marinha, as mulheres representam 12%; e, na Força Aérea, 21%. Isso demonstra a reprodução, no âmbito militar, da cultura social de violência de gênero em que se constatou que, no ano passado, 88% dos crimes de estupro no Brasil foram praticados contra mulheres”.

“Parece-me que conjugar a condição de mulher e de militar talvez não se amolde ao conceito de interseccionalidade tradicionalmente estabelecido em 1989 (o seccionalidade)”, destacou a ministra Maria Elizabeth, em sua palestra. 

A pesquisa “Assédio Sexual nas Instituições de Segurança Pública e nas Forças Armadas” e mencionada por ela, foi desenvolvido pela juíza auditora Mariana Aquino em parceria com o juiz de Direito Rodrigo Foureaux.  O estudo continha 18 perguntas dirigidas ao contingente feminino e recebeu respostas de 1.897 mulheres das carreiras militar, policial, de bombeiro e da guarda municipal das mais variadas regiões brasileiras. Como resultado, 74% delas relataram haver sido vítimas de assédio sexual e, em 83% desses episódios, as entrevistadas não denunciaram o abuso sofrido. 

“Os autores concluíram que o assédio se manifesta de modo contumaz nas Forças Armadas e nos órgãos de Segurança Pública, advertindo que essas instituições não promovem campanhas de prevenção vocacionadas a coibir a perpetuidade de tais práticas sob a perspectiva de gênero”, observou a ministra, comentando o Capítulo desse estudo que lhe chamou especial atenção: “foi o depoimento de policial penal mulher a respeito da tradição sexista compartilhada pelos seus colegas de farda homens nos presídios. Ela citou ‘Brincadeiras indecentes, insinuosas, machistas, desrespeitosas, abraços maliciosos e olhares inconvenientes que, por vezes, sofre no dia a dia. Para não sofrer retaliações a policial disse levar na esportiva’”.

Em relação às Forças Armadas, 71,2% das entrevistadas na pesquisa trazida pela ministra informaram ter sofrido assédio sexual. Sob o prisma da violência de gênero na caserna e nas instituições de segurança pública, foi identificado que os assediadores eram cometidos por superiores hierárquicos em 85,5% dos episódios. Igualmente, revelou que, em 10,2% dos casos, o assédio sexual foi praticado por profissional de igual patente e que, em 2% deles, o ilícito foi cometido por agente subordinado à vítima.

Paralelamente, no ensaio empírico Assédio Sexual na Polícia Militar do Pará: um Reflexo Negativo das Relações de Trabalho e Gênero, os acadêmicos Fábio Ricardo e Eunápio Dutra constataram que 44% das 90 militares inquiridas se reconheceram vítimas de assédio sexual. Ainda, 73% delas informaram haver testemunhado alguma forma de assédio no trabalho. 

No Rio, por sua vez, o estudo A Violência Silenciosa: Percepções Femininas sobre o Assédio na Polícia Militar do Rio de Janeiro, a jurista Cláudia Rosa identificou que, das 217 militares consultadas, 75% reportaram ter sofrido assédio sexual ou moral e que 47,2% delas foram vítimas de assédio sexual. 

Ao fim, acrescento análise desenvolvida pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em parceria com a Fundação Getúlio Vargas, denominada As Mulheres nas Instituições Policiais, revelou que 39,2% das policiais interpeladas foram vítimas de assédio moral ou sexual e que 25,5% delas sofreram assédio sexual. 

“Esclareço que o conceito de assédio sexual empregado na pesquisa foi o de contato físico entre agressor e vítima, cenário extremamente restrito e que justificaria, em tese, o modesto percentual detectado quando comparado às análises previamente mencionadas. De todo modo, se considerado o critério metodológico adotado, o índice me parece nitidamente significativo”, completou a ministra, Maria Elizabeth.

Numa ação mais efetiva para o combate a esses crimes, e atento aos desvios dessa natureza nas Forças Armadas, o Superior Tribunal Militar, manteve condenação, por unanimidade, imposta pelo juízo de primeiro grau a militar que praticara crime de assédio sexual em desfavor de sua subordinada.

“A Justiça Militar da União, na missão constitucional de proteger a ‘ultima ratio’ do Estado, deve reprimir os delitos praticados contra a dignidade sexual, especialmente quando atingirem os subordinados do agente”, esclarece a ministra.

“Os crimes dessa estirpe, por sua gravidade, exigem proporcional resposta Estatal. Nesse cenário, sem qualquer condescendência, a Justiça Especializada reprime os delitos de natureza sexual e, fruto do ataque ao bem jurídico tutelado, protege as mulheres”, reforça. 

Segundo a ministra, “inúmeros mecanismos foram implementados pelo Superior Tribunal Militar no sentido de outorgar visibilidade ao tema, a exemplo da adesão à campanha 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher, concebida pela Organização das Nações Unidas e fomentada pelo Conselho Nacional de Justiça. 

Foto: Agência Brasil

Fonte: Brasil 247

Escrito por:

Jornalista. Passou pelos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora-pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" e "Imaculada", membro do Jornalistas pela Democracia

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