
Trump x Trump
Sim, o título faz uma referência, óbvia para os cinéfilos, ao sensacional filme de 1979, com Dustin Hoffman e Meryl Streep, “Kramer vs. Kramer”, sob o drama da separação de um casal – mas param aí as coincidências, até porque as figuras na ribalta, dois bilionários, tem tudo menos empatia e sentimentos que não pareçam ditados por uma Inteligência Artificial disfuncional. Mas não vamos aqui dar corda para a DR fabricada, e alimentada pelas redes – a que pertence a uma das partes, o X, e a criada pelo outro, o Truth Social, plataforma da Trump Media & Technology Group. Essa bolha onde muitos respiram hoje, como no filme Matrix – lá vem o cinéfilo, de novo -, onde, fora do mundo plástico, no inferno de Dante, a biomassa drenada de pilhas de corpos produz energia para alimentar suas IAs. Aliás, a teoria de que a realidade – cada vez mais impulsionada pelas redes sociais- , é uma simulação do que realmente acontece, ganha fôlego na física quântica.

Mas vamos aterrissar. O maior inimigo do novaiorquino republicano Donald John Trump, pela segunda vez no trono do Salão Oval, é ele mesmo. Não é Musk – não seja ingênuo -, nem Maduro, nem Xi Jinping, nem o Aiatolá Ali Khamenei, nem o cubano Miguel Díaz-Canel. Nem Lula – imagina, não é mosca para esse mel. Como todo ser humano – por mais que pareça um presidente reborn -, sua formação moldou seu caráter, suas atitudes, seu governo, e, em última instância, definirá o futuro do seu país, se o do “sonho americano” ou do “conto da aia” – mais até do que o futuro do planeta. Sem querer deitar Trump no divã, nem tenho licença médica para isso, sua trajetória revela um homem que tem muito medo de si mesmo. Seu aparente arrojo, bravura, valentia, esconde um covarde, que cria inimigos para não olhar para dentro de si. Sua formação na Academia Militar é um bom exemplo. Em um trecho de seu livro Lucky Loser, Russ Buettner e Susanne Craig contam como um adolescente Trump ansiava por elogios e autoridade imerecidos na Academia Militar de Nova York, onde misteriosamente ascendeu na hierarquia, apesar de se esquivar habitualmente de seus deveres. “Seu pai era rico”, lembra um colega de classe, “e ele era protegido”. Leia essa reportagem da Vanity Fair.

Trump simplesmente não funciona – talvez apenas o devasso, envolvido em muitos escândalos sexuais, o último deles “lembrado”, em tom de ameaça por Musk, como um dos frequentadores do cardápio do empresário Jeffrey Epstein, envolvido em casos de prostituição e exploração de menores, e que morreu na prisão em 2019. No escândalo envolvendo pagamentos à atriz pornô Stormy Daniels, com o objetivo de comprar o silêncio dela, teve que pagar multas milionárias, tornando-se o o primeiro presidente já condenado na Justiça da história dos EUA. A questão é que Trump é um fracasso. Felizmente, na maioria dos casos, já que só promete ou propõe bullshit.

Trump foi declarado culpado por 34 delitos que lhe foram imputados por falsificar documentos com o intuito de ocultar pagamentos à atriz pornô Stormy Daniels, na foto. Reprodução.
Na economia, na política interna e externa, na saúde, na educação, no combate às drogas. Quer acabar com a chacina em Gaza criando um “spa” judeu, e despreza – inclusive publicamente, com requintes de crueldade- o presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski. É a chamado “diplomacia do bullying” – recebe na Casa Branca e humilha. Televisionado ao vivo direto do Salão Oval. Fez o mesmo com Mark Carney, recém-eleito primeiro-ministro canadense – país que ameaçou “anexar”. Carney disse que seu país “nunca estará à venda”. Trump rebateu: “Nunca diga nunca.” Mas talvez, pessoalmente, o que mais que marcou foi o encontro com Cyril Ramaphosa, presidente da África do Sul. Trump alegou, e passou um vídeo montado, e o fez assistir, para “provar” que há um “genocídio branco” no país – você leu direito, no país do apartheid. O vice-presidente, J. D. Vance é o coringa do jogo, entra e lacra.

Trump é uma grande fraude. Sem entrar no mérito das insanidades, as promessas que fez e refez — uma ótima economia, uma política tarifária que protegesse os produtos “made in USA”, entraram em parafuso e deixaram empresas multinacionais americanas inseguras sobre como planejar e países estrangeiros incertos sobre como negociar. Prometeu lidar com a entrada de drogas – seu país é o maior consumidor de drogas do planeta – criar pena de morte para traficantes, embargos navais aos cartéis, balela.

Na saúde, só fala em implodir o Obamacare, num país sem SUS. Os planos de saúde, subsidiados com base na renda, foram introduzidos pela Lei de Assistência Médica Acessível de 2010, a legislação emblemática do ex-presidente Barack Obama. Na educação, corta verbas de universidades históricas e fala em remover os “marxistas” do Departamento de Educação – onde já ouvimos isso antes? A Universidade de Harvard, a primeira a resistir, diz que se recusa às exigências da Casa Branca – combater o antissemitismo no campus, por exemplo -, de mudar suas políticas ou perder dinheiro federal. Obama é ex-aluno de Harvard. Trump se formou na Wharton School of Business, na Universidade da Pensilvânia, com um diploma de bacharel em economia.
Na segurança pública, prometeu que aprovaria um “investimento recorde” para contratar e retreinar policiais, fortalecer proteções como imunidade qualificada, aumentar as penalidades por agredir a lei policiais e mobilizar a Guarda Nacional quando a polícia local “se recusar a agir”. Tudo o que faz é atuar pela expulsão de imigrantes de forma desumana e sem critérios – como o caso agora, na Califórnia. Trump também acrescentou que emitiria uma ordem executiva instruindo as agências federais a cortar programas que promovem transições de gênero, além de pedir ao Congresso que pare de usar dólares federais para promover e pagar por procedimentos de afirmação de gênero. Trump disse que também demitiria funcionários contratados para implementar a política de Biden e, em seguida, restabeleceria sua ordem executiva de 2020 que proíbe os estereótipos raciais e sexuais no governo federal.
Trump também é defensor da indústria armamentista, e simpatizante da National Rifle Association Institute for Legislative Action, a NRA, lobby da indústria armamentista. Patrocina programas sobre segurança de armas de fogo para crianças e adultos, incluindo um programa para crianças em idade escolar, o “Eddie Eagle”. Ao assumir, Trump prometeu “jogar fora ” qualquer proposta de seu antecessor para reprinir a indústria de armas de fogo. Essa promessa, acredito, está cumprindo: cada vez mais norte-americanos têm acesso a armas, a violência piora de forma clara.
Não, não é o anticristo, não tem tutano para isso – ainda não há chifres visíveis, vão me avisando -, mas é uma figura pública, no mínimo, preocupante e deprimente para o planeta – ainda mais no comando da auto-declarada “maior potência do planeta”.

Trump,o Anticristo: tema tem movimentado redes sociais e podcasts, com ou sem lógica. Imagem do site Beware of Trump the Antichrist-Dajjal
Ególatra, um verdadeiro outsider político, compulsivo sexual, homofóbico, xenofóbico, mentiroso contumaz, germofóbico – “sou um fã de mãos limpas”, disse numa entrevista a Howard Stern -, mal admnistrador – seis de suas empresas foram declaradas falidas porque não conseguiram pagar as suas dívidas, entre elas o Casino Trump Taj Mahal em Atlantic City, o Plaza Hotel Nova York, e o Trump Entertainment Resorts, empresa sucessora do Trump Hotels & Casinos Resorts -, Trump é a bomba relógio do planeta.

Talvez ainda viva a ilusão de seus tempos como apresentador do Programa “O Aprendiz”. Quem deve demitir Trump nas próximas eleições é o povo norte-americano, com seu sistema eleitoral caótico e suas urnas de papel.
Imagem gerada em IA
Com informações da Vanity Fair, NYT, CNN, BBC e portal Governing