
America Party, facção de Elon Musk para confrontar o “bipartidarismo” norte-americano, expõe extrema-direita do Vale do Silício
No ápice de sua briga, pelas redes – embora seja fatal sonhar com os dois se espancando num ringue – com o ex-dating Donald Trump, o bilionário Elon Musk, depois de trocas de mensagem de baixo calão e graves ameaças recíprocas, jurou criar uma espécie de terceira via a Republicanos – partido do atual presidente – e Democratas – de Biden, Obama, Clinton, Carter, entre outros. Não está escrito em lugar nenhum, mas historicamente os Estados Unidos viraram um país bipartidário – desde 1852, sempre tiveram presidentes de um partido ou de outro. Isso não significa que não possam existir outros partidos, e existem – até um comunista, pasmem, de vertente marxista-leninista, com votação sempre residual. E é nessa onda que Musk – o CEO da Tesla, Space X, sua subsidiária Starlink , e dono do X -, que foi o maior doador individual da campanha de Trump, chegando a ser nomeado conselheiro presidencial – ameaça surfar: criar o seu America Party para “devolver a liberdade aos EUA”. Ele até sonha em, como nas redes, engajar a ideologia pelo mundo. Pelos pensadores com quem tem conversado, gente barra pesada, o America Party seria uma máfia de extrema-direita do Vale do Silício, que adoraria dominar a porra toda.

Obviamente, Musk pode estar blefando. Mas ele tem de fato mantido contato com gente como o “programador” do Vale do SIlício Curtis Yarvin, hoje filósofo antidemocrático, que oferece insights sobre um novo manual para um governo de elite e governança corporativa, num futuro pós-democrático, que promoveria ideias autoritárias e elitistas, com traços antidemocráticos e até com visões racialistas. E Peter Thiel – magnata da tecnologia, outro bilionário defensor da “tecnocapitalismo”, onde manda quem controla empresas de tecnologia disruptivas. Muitos chamam de Máfia do PayPal — um grupo de estrelas do Vale do Silício com ligações ao período de formação do aplicativo de pagamentos — e tornou-se parte integrante do segundo governo Trump. Em comum, Musk, Yarvin e Tiel, todos podres de ricos, têm uma obsessão por mudar a forma de governo no planeta, por algo mais parecido com uma monarquia de CEOs do Vale do Silício – já apelidada de Gov-Corp, ou Government Corporation.
E outra – e isso não é folclore, gente – são todos obcecados por uma perseguição doentia pela imortalidade, em projetos em que têm investido fortunas, envolvendo criogenia – à frente empresas como Alcor e Cryonics Institute -, e transferência de consciência para um computador – objeto da startup Nectome. Thiel e Sam Altman, da OpenAI, aplicaram milhões na Retro Biosciences, startup de biotecnologia da Califórnia focada em prolongar a vida por meio da autofagia celular. Bill Gates parece ser o único do bando a recusar financiar projetos de vida eterna.
Curtis e Yarvin: coloquem esses nomes na boca do sapo
Curtis, cientista da computação, blogueiro e teórico político norte-americano, mais conhecido pelo pseudônimo Mencius Moldbug, é uma figura lendária no movimento neorreacionário (NRx), também chamado de Iluminismo das Trevas – você vai ouvir muito essa expressão -, que propõe uma crítica radical à democracia liberal e ao igualitarismo moderno. A partir de 2007, Yarvin ganhou notoriedade com o blog Unqualified Reservations, onde passou a defender que a democracia é um sistema falido e ineficiente. Ele propõe substituí-la por um modelo de governo autoritário, liderado por um “CEO soberano”, inspirado no cameralismo prussiano — uma filosofia administrativa que trata o Estado como uma empresa. Esse modelo é denominado por ele de “neocameralismo”. Entre seus conceitos mais influentes está o termo “A Catedral”, que descreve uma suposta aliança informal entre universidades, mídia e burocracia, responsável por moldar e perpetuar valores progressistas e igualitários na sociedade ocidental.

Embora inicialmente marginal, as ideias de Yarvin ganharam espaço em círculos conservadores e tecnocráticos nos EUA. Ele é citado como influência por figuras como o bilionário Peter Thiel, o senador J.D. Vance e o investidor Marc Andreessen. O investidor e empreendedor de tecnologia Thiel, nascido na Alemanha, um “disruptor” do Vale do Silício que ajudou a fundar o PayPal ao lado de Elon Musk e fez fortuna como um dos primeiros investidores do Facebook, catapultou-se para o topo da classe de megadoadores ao investir nas campanhas de Trump e candidatos conservadores. Virou ume lenda. Thiel é outra figura central do futuro America Party, se vier a existir. Ele está em todas as frentes. Para exemplificar seu caráter, criou a Thiel Fellowship, financiando jovens para abandonarem a universidade e iniciarem projetos próprios,e investiu em biotecnologia antienvelhecimento -como a SENS Foundation -, entre outras paradas elitistas.

Outros bilionários já flertaram com Musk pela criaçãoda facção política America Party, compartilhando a visão do ex-chefe do Departamento de Eficiência Governamental (DOGE) de criar um partido “tecnolibertário”. Como o empresário e investidor Mark Cuban, que expressou apoio público à criação do America Party, elogiando a estratégia de Musk de focar em cadeiras-chave no Congresso para influenciar a legislação . Em seu podcast Pod Save America – todos parecem ter um – afirmou que o Partido América se concentrará em algumas cadeiras importantes na Câmara e no Senado que poderiam servir como “voto decisivo” em “leis controversas”. “É assim que Elon pensa. Ele busca influência. E há uma influência absoluta em garantir que os dois partidos no poder não tenham poder suficiente para aprovar nada”, disse Cuban no podcast.

Influenciadores fascistas
Lá, como aqui, “influenciadores” fascistas – nossos Monarks e Alexandres Garcias – também fazem seu trabalho. Anthony Scaramucci, ex-diretor de comunicações da Casa Branca, manifestou interesse em se reunir com Musk para discutir o partido. Andrew Yang, fundador do Forward Party, Yang afirmou estar em contato com Musk e sua equipe, sugerindo colaboração para desafiar o sistema bipartidário. Andrew Yang, ex-pré-candidato presidencial democrata em 2020, e fundador do Forward Party, em 2022, – uma fusão de dois embriões partidários, Serve America Movement e o Renew America Movement – , legenda centristra, defende, entre outras bizarrices elitistas. a implementação do voto por classificação (ranked-choice voting), que atribui uma ordem de preferência aos candidatos. O presidente do Comitê Nacional Libertário, Steven Nekhaila, mandou um recado para Musk: junte-se a nós e não lute a difícil batalha de lançar um terceiro partido. “Criar um novo terceiro partido seria um erro”, disse Nekhaila ao Score na terça-feira. “O Partido Libertário é o partido mais preparado para ser o partido dissidente e subversivo.”

Joe Rogan, que ganhou destaque como comentarista de UFC (Ultimate Fighting Championship) – carro-chefe da franquia de açougue de luta entre artes marciais mistas (MMA) – que se chama de esporte -, usa seu atual podcast The Joe Rogan Experience para defender a “Musk Experience” – por sinal, seu recordista como convidado ao canal. Na Alemanha, Naomi Seibt, conhecida como a “anti-Greta”, tem interagido com Musk nas redes sociais e compartilha de suas visões políticas, especialmente em relação ao partido de extrema-direita alemão AfD, que Musk também apoia publicamente. Empresário e influenciador baseado em Dubai, Mario Nawfal tem sido amplamente promovido por Musk nas redes sociais. Ele conduz entrevistas com líderes políticos controversos e é visto como uma voz alinhada às visões geopolíticas de Musk, especialmente em relação à Rússia e ao Oriente Médio. Líder do partido Reform UK e figura central no Brexit, Nigel Farage manteve diálogos com Musk sobre possíveis doações ao seu partido. Líder do Partido Conservador do Canadá – até no Canadá, minha gente! – Pierre Poilievre foi elogiado por Musk, que compartilhou entrevistas suas e demonstrou apoio às suas políticas conservadoras.
Ativista anti-Islã e influenciador, Taleb Al-Abdulmohsen, direto da Arábia Saudita – já uma monarquia absoluta teocrática, sonho de Musk – onde o príncipe herdeiro autorizou o assassinato do jornalista Jamal Khashogg, que era colunista do The Washington Post, em caso de repercussao mundial – declarou o bilionário do X como uma de suas principais inspirações políticas. Ele utilizou avatares de IA com a imagem de Musk para promover mensagens contra o governo alemão e em apoio ao AfD.

Como escreveu Aldous Huxley, na obra-prima “Admirável Mundo Novo”, As flores do campo e as paisagens têm um grave defeito: são gratuitas”.
- Foto de capa: O bilionário Elon Musk, idealizador do America Party, em foto postada nas redes sociais. Reprodução do perfil DogeDesigner/X.