California nightmare: Newsom versus Trump coloca rival democrata diante da biliocracia de Trump, mas expõe governador, ex-liberal que não esconde a obsessão de ser presidente

11 de junho de 2025, 22:50

Os violentos protestos de imigrantes em Los Angeles, reagindo de forma furiosa, mas proporcional, às truculentas ações anti-migratórias do ditador xenofóbico Donald Trump – uma onda de revolta e ódio que já se espalhou para outros estados e chegou até Manhattan-, e a decisão do “Taco” de mandar a Guarda Nacional e, depois os fuzileiros navais, para o “Estado dourado” – estamos esperando quando virá uma chuva de Napalm, como no Vietnã -, colocaram no front político um figura até então opaca, o governor da Califórnia, Gavin Newsom.

Para quem não está familiarizado, Trump sai do sério com o apelido “Taco”, e não estamos falando da iguaria mexicana. O sarro, que pegou – como todos pegam, especialmente se você não gosta -, é uma sigla, em inglês, com as iniciais “Trump Always Chickens Out”, ou “Trump Sempre se acovarda”, em tradução livre para o português. Mas voltemos aos fatos.

Um dos muitos produtos “Taco” vendidos nos EUA e outros países, on e offline, no caso uma camiseta da loja virtual News Thump, que assim descreve: “Os mercados financeiros sabem disso, o eleitorado sabe disso, e agora você sabe – TACO (Trump Always Chickens Out). Mostre ao mundo que você sabe que Trump tem uma barriga amarela com a nossa camiseta TACO!”. Preço: o equivalente a 150 reais.

Newson parece o herói anti-Trump – num país que adora fabricar heróis, inclusive os da Marvel e da DC -, mas, para os críticos, é um ex-liberal obcecado em se tornar presidente, e daí derivaria sua forte reação a Trump, ainda que por uma causa legítima e justa. O democrata, que poderá se lançar candidato à Presidência em 2028, investiu, ao longo de sua carreira política, em uma pauta progressista, embora tenha feito acenos ao centro. Parece um político dúbio, mas é uma das poucas figuras públicas, com mandato, hoje, que defendem uma causa decente: o direito dos imigrantes, que, como eles mesmos dizem em cartazes, empunhando suas bandeiras, especialmente a do México, “ajudaram a construir a América”.

Governador Gavin Newson em pronunciamento público faz duras críticas a Trump e peita o presidente: “Isso foi diferente de tudo. Donald Trump, sem consultar as autoridades e líderes californianos, mandou para cá a Guarda Nacional, inflamando a situação. Ele fez isso de propósito”. Imagem capturada do site da BBC.

Parecendo cada vez mais descontrolado, Trump não se satisfez em mandar os marines – supra-sumo das Forças Armadas dos EUA, especializados em operações em ambientes hostis – para a Califórnia, sem consultar o governador, como, na segunda-feira, 9, diante da reação irada de Newsom, ameaçou prendê-lo – isso mesmo. Ao ser questionado por jornalistas, Trump afirmou que prenderia Newsom se fosse Tom Homan, o “czar” da fronteira norte-americana. E apelou para chantagem nada republicana: deixou vazar que a Casa Branca está considerando cortar a ajuda federal à Califórnia, incluindo bilhões de dólares em bolsas educacionais. O próprio procurador-geral da Califórnia, Rob Bonta, afirmou em comunicado que a ação atropelou a soberania do estado. Trump respondeu no estilo troglodita. Em um post, usou um trocadilho com o sobrenome do governador, trocando “Newsom” por “Newscum” — expressão ofensiva em inglês que remete à ideia de “nova escória”. Sobre a ameaça de prisão feita pelo governo Trump, Newsom afirmou que a declaração “é um passo claro em direção ao autoritarismo”. E elevou o tom.

Em um discurso televisionado na terça-feira, 10, à noite, o governador da Califórnia acusou Trump de “abuso descarado de poder”. O discurso do governador, feito de terno e em frente às bandeiras da Califórnia e dos EUA, recebeu ampla cobertura da imprensa e atraiu mais de um milhão de visualizações em vários canais do YouTube. A equipe de imprensa de Newsom também tem se mostrado ativa nas redes sociais, comparando Trump ao maligno Imperador Palpatine dos filmes Star Wars.

“Não quero uma guerra civil, mas…”: Trump critica governador da Califórnia em meio a confrontos em Los Angeles. Donald Trump disse que “seria ótimo” se o governador da Califórnia fosse preso. Imagem postada no X pela Casa Branca.

O mandato de Newsom termina em 2026. Pela lei estadual, ele não pode disputar a reeleição. Por isso, 2028 parece piscar-lhe os olhos. Ele foi reeleito para um segundo mandato de quatro anos em 2022 pelo partido de oposição a Trump – num país, na prática, bipartidário-, e se envolveu mais na política democrata nacional, alimentando especulações de que tinha mesmo ambições presidenciais. O governador tem uma longa trajetória política. Aos 36 anos, foi eleito prefeito de São Francisco e permaneceu sete anos no cargo, até se tornar vice-governador da Califórnia, em 2011. Ele disputou o governo estadual nas eleições de 2018, vencendo com ampla vantagem. Durante seu mandato, enfrentou a pandemia de Covid-19.

Newsom se tornou um representante de alto nível na campanha de reeleição de Joe Biden e foi à Fox News para debates de alto nível com o governador da Flórida, Ron DeSantis, que na época concorria à indicação presidencial republicana, em dezembro de 2023. Após a reeleição de Trump em novembro passado, Newsom chegou a ensaiar uma guinada para o centro político, chegando a convidar o ex-assessor sênior da Casa Branca, Steve Bannon, para seu podcast político, provocando a ira de alguns no Partido Democrata, e a defender causas reacionárias, como pedir a redução de benefícios de saúde para trabalhadores indocumentados. Mas o “ataque” de Trump à Califórnia pareceu a oportunidade perfeita para retomar essa profunda divisão política e reacender o tesão do velho democrata – velho é modo de dizer, ele tem 57 anos contra os 78 de Trump.

“Esta é, sem dúvida, uma oportunidade para Gavin Newsom”, disse Darry Sragow, um veterano estrategista democrata da Califórnia. Sragow diz que quanto mais Newsom puder delinear uma história de Trump contra a Califórnia — um estado com o qual o presidente tem um rancor muito claro — maiores serão as chances de o governador se beneficiar. “Não transforme isso em um tiroteio mano a mano entre dois pistoleiros nas ruas de Laredo”, disse ele, referindo-se a uma conhecida cidade texana do “velho oeste” – que gerou até uma série de televisão norte-americana de faroeste.

O governador da Califórnia acusa o presidente Donald Trump de “abuso descarado de poder”. Foto de arquivo: Getty Images.

Enfim, Newsom está planejando uma futura candidatura à Casa Branca? Apenas dizer isso é minimizar sua coragem política e a defesa da autonomia de seu estado e de um tema crucial: a legitimidade dos imigrantes viver e trabalhar nos Estados Unidos. Mas ignorar isso é ingenuidade política – apesar da distância do próximo pleito, que ocorrerá em 7 de novembro de 2028. Trump frequentemente se beneficiou de ter um adversário político com o qual se contrastar — seja Hillary Clinton em 2016, Nancy Pelosi nos últimos anos de seu primeiro mandato presidencial ou Kamala Harris, que substitiu Joe Biden a quatro meses das eleições nos EUA – já com limitações congnitivas significativas -, o que trouxe o bilionário republicano de volta ao poder. Newson é diferente de todos. Embora haja riscos para Newsom nessa luta — a suspensão da ajuda federal à Califórnia e a ameaça de prisão são apenas dois dos principais —, parece um confronto que ele parece mais do que disposto a abraçar. Vindo de onde veio, das sombras da política norte-americana, tem muito menos a perder que Trump.

Fotos creditadas nas legendas. Foto de abertura gerada em IA.

Artigo com informações colhidas em diferentes fontes, especialmente G1, BBC, CNN e Intelligencer.

Escrito por:

Jornalista há 40 anos, já foi repórter e editor nos maiores veículos do país - O Globo, Jornal do Brasil, Folha de S.Paulo, Correio Braziliense, Istoé - assessor de imprensa, analista sênior de informações e/ou ex-diretor de agências de comunicação corporativa - FSB Comunicação, Santafé Ideias, entre outras -, ex-professor de Jornalismo da PUC-RJ, trabalhou no Senado Federal e na Prefeitura do Rio. Já foi assíduo colaborador dos sites Os Divergentes e DCM. E criador, com meu irmão Paulo Henrique, da revista cultural Tablado, que durou 20 anos a acabou na pandemia. Premiado, entre outros, com Prêmio Esso, Embratel e Herzog. E, PRINCIPALMENTE, pai do Bruno e da Gabriela, orgulhos da minha vida.