
O “Elon Musk brasileiro”, que sonha em ter sua Tesla, quebrar o monopólio multinacional da indústria automobilística e produzir um carro 100% nacional – mas para ricos.
Você certamente nunca ouviu falar dele, mas, apelidado de “Elon Musk brasileiro”, o capixaba Flávio Figueiredo Assis, fundador da Lecar, sonha alto. Tudo bem que seus modelos são questionáveis. O controverso, pra dizer o mínimo, empresário Elon Musk, que coleciona empresas, como SpaceX, Tesla, Neuralink, OpenAI, X (antigo Twitter), a lista é interminável, tem, guardadas as devidas proporções, sua versão tupiniquim, o dono da Lecar, fabricante brasileira de veículos híbridos e elétricos criada para revolucionar a mobilidade no Brasil e na América Latina. Na carona da transição energética. Se vai conseguir, é outro papo. A própria Lecar, inclusive, deveria ser uma réplica nacional da Tesla, com carros 100% elétricos. Mas os planos mudaram conforme Assis percebeu a vocação do país para os motores híbridos. Não é para qualquer bolso. Quando pronto, um Lecar modelo 459, o primeiro carro híbrido 100% nacional, ainda em fase dos protótipos, custará a bagatela de “apenas” – está escrito assim no site da empresa – R$ 159.300,00. Mas, segundo a empresa, a pré-venda já acumula mais de 1.000 poteciais compradores.

A autonomia da bateria será, de acordo com a empresa, de 400 quilômetros. A estimativa é produzir 300 veículos por mês já no primeiro ano de fabricação, gerando R$ 1 bilhão de faturamento. O foco das vendas será a Grande São Paulo, especialmente entre a capital paulista, Campinas e São José dos Campos, onde a empresa deve investir em uma rede de infraestrutura para recarregamento de bateria.

Somente a parte eletrônica, motores e baterias, virão do fabricante chinês Wiston, que também fornece para outras duas gigantes do setor. O restante, que representa 65% das peças, são nacionais. Então o 100% nacional já virou balela. “Peguei meu patrimônio e arrisquei em um negócio louco. Elon Musk também fez isso. As pessoas estão buscando mais estabilidade do que inovação, e um empreendedor tem que arriscar mais em prol de um mundo melhor”, disse Flávio, em entrevista recente. “Eu me inspirei muito na história dele. Nas minhas primeiras pesquisas, quando fui ler algumas biografia, me inspirei muito em Elon Musk, no Tesla, também no Gurgel. Acho que cada nação deveria ter um Elon Musk”, diz ele. As coincidências não param aí. Flávio explica que, no início, trouxeram um carro da Tela para o time de engenharia desmontar e montar novamente.
A ideia inicial era começar a produzir no final de 2024, mas o processo está um pouco atrasado. Assis não esconde que sua aspiração é ser uma versão brasileira do empresário Elon Musk, fundador da Tesla. Até mesmo o primeiro projeto da Lecar, o modelo 459, é uma espécie de SUV cupê, baseado no Tesla Model. Eles participarão, pela primeira vez, do Saláo do Automóvel – de 22 a 27 de novembro, no Anhembi.
Veja a entrevista no podcast BMC&News.
Segundo Flávio, o capital é 100% próprio, mas a expectativa é fazer o IPO (oferta pública inicial) em 2025. Ao todo, 150 pessoas estão envolvidas no projeto, sendo que 30 funcionários diretos compõem o quadro de funcionários da empresa, muitos deles com passagens importantes por empresas como a histórica Gurgel, Troller, JPX, Ford, Toyota, Nissan e Marcopolo. Ao final, o protótipo do carro elétrico deve ser finalizado em abril deste ano, quando será enviado para Londres, na Inglaterra, para as homologações.
Flávio Figueiredo é natural de Guaçuí, na Região do Caparaó do Espírito Santo. Formou-se em Contabilidade e Direito. Antes de ter uma montadora de veículos elétricos, o empresário foi dono de uma empresa de uma administradora de cartões PAT (Programa de Alimentação do Trabalhador), que chegou a uma movimentação anual de R$ 1 bilhão, fornecendo para mais de 600 prefeituras e órgãos públicos e mais de 3 mil empresas privadas.
A sede da Lecar (que inicialmente chamava-se Lecard), com 400.000 m² de área construída, fica fora do circuitão Rio-Sâo Paulo – a fábrica está instalada em Sooretama (ES), a 119 km de Vitória, cidade de 26,5 mil habitantes. Fundada em 2022, a sede da montadora está localizada em Alphaville, na Grande São Paulo. A planta industrial fica em Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde estão outras empresas do setor.
A ideia do nosso “Elon Musk” – ele mesmo gosta da comparação e a explora nas redes sociais – é apostar pesado num mercado dominado pelas multinacionais e ocupar o vácuo de décadas deixado por uma primeira experiência, a Gurgel Motores, o sonho do carro 100% nacional, de João Augusto Conrado do Amaral Gurgel, engenheiro e industrial brasileiro, nascido em Franca, no interior de São Paulo. Chegou a produzir 40 mil veículos de 20 modelos, mas com outra proposta: barato, eficiente e econômico, quase tosco. Há mais de 40 anos, a Gurgel já apostava em carros elétricos. O Itaipu E400, criado em 1980, era um furgão com o equivalente a 11 cv e autonomia de 80 quilômetros. O veículo foi o primeiro carro elétrico produzido em série no país. Xavante, Supermini, Bugato e Tocantins foram nomes de outros modelos conhecidos da fabricante. Pediu concordata em junho de 1993 e a fábrica foi declarada falida em 1994.

Em entrevista à Folha de S.Paulo, Fernando do Amaral Gurgel, filho do empresário João Augusto Gurgel, falecido em 2009, culpou os governos do Ceará e de São Paulo. Ele alegou que houve “traição” por parte dos ex-governadores Ciro Gomes, do Ceará, e Luiz Antônio Fleury Filho, de São Paulo. Independentemente das razões para o fim da empresa, o certo é que hoje a Gurgel vive nas garagens de colecionadores e no imaginário dos amantes de automóveis. Vejamos o futuro da Lecar, do nosso “Elon Musk” capixaba.
Imagem mais recente de Flávio Figueiredo Assis, CEO e sócio-fundador da Lecar, durante entrevista ao podcast BMC&News