
A farda ainda é depreciada como camuflagem dos golpistas fracassados
Especialistas que sempre socorrem fascistas em dificuldades, em entrevistas aos jornalões, apresentaram um argumento previsível para defender a aparição de dois coronéis fardados em interrogatórios no Supremo.
A farda, disseram alguns especialistas ouvidos, é indissociável do corpo, da vida e da imagem dos oficiais. Seria, para usar um clichê de semiótica de boteco, como se a farda fosse uma segunda pele dos coronéis Hélio Ferreira Lima e Rafael Martins de Oliveira.
Alexandre de Moraes determinou que os dois acusados de participar da turma que elaborou o plano para eliminar Lula, Alckmin e o próprio ministro voltassem à audiência online sem farda.
E se alastrou então mais uma controvérsia sobre direitos sempre reclamados pelos golpistas. Na base de que todos os militares são irreconhecíveis sem essa segunda pele, por serem fortes demais os simbolismos de todas as representações do poder armado.
E assim vai se reafirmando como verdade que militares são diferentes de todo o resto dos humanos civis. Porque se sabe que dois médicos de um hospital público, acusados de crimes graves e tornados réus, seriam vistos com estranheza se aparecessem vestindo seus aventais brancos, quando da audiência diante de um juiz.
Médicos réus não usariam sem questionamentos o avental do hospital, com o logotipo no peito, durante um interrogatório em que eles, e não o hospital, são considerados criminosos. E o avental é a segunda pele de médicos e enfermeiros.
Os militares que apareceram fardados pertencem a um grupo que fracassou na execução de um plano que previa até assassinatos. Fracassaram depois ao não conseguir manter o plano sob sigilo.
É a acusação que pesa contra eles, no indiciamento pela Polícia Federal e na denúncia pela Procuradoria-Geral da República. São profissionais expostos por um fracasso público, notório, destruidor da imagem da instituição a que pertencem.
Mas apareceram fardados para sugerir que tudo o que fazem é pelo Exército. E que, se falharam na execução do plano que os transformou em réus, devem mesmo assim apresentar-se como servidores da arma que lhes dá a farda.
Estariam eles fardados quando da reunião de 22 de novembro de 2022 na casa do general Braga Netto, quando teriam acertado detalhes do plano, segundo a PF e a PGR? Teriam se fardado no dia 15 de dezembro, quando deveriam capturar Alexandre de Moraes e desistiram de levar o sequestro adiante?
Em quais circunstâncias os militares brasileiros se consideram em missão oficial e a serviço da pátria, com o uso de fardas e, se possível, de insígnias e honrarias?
Usam fardas quando digitalizam pensamentos golpistas? Quando transformam em textos os planos criminosos elaborados sob o pretexto, apresentado depois ao juiz, de que são hipóteses levantadas pelo setor da inteligência fardada?
Os dois coronéis tentaram se proteger na trincheira do Exército que os acolhe, e que não teve envolvimento de seu comando no plano do golpe. Exército que, segundo o ministro Alexandre de Moraes, não está em julgamento no STF.
Mas o então comandante geral das Forças Armadas, o ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira, é réu sob a acusação de golpismo. E o general estava acima dos chefes militares das três armas e de seus subalternos também acusados de participação na tentativa de golpe.
Está no site do Ministério da Defesa: “O presidente da República é o comandante supremo das Forças Armadas, conforme estabelecido no art. 142 da Constituição Federal, e o ministro de Estado da Defesa exerce a direção superior das Forças Armadas”.
O organograma no site mostra graficamente essa hierarquia. Mas os oficiais fardados fizeram o que nem os generais tentaram fazer quando interrogados, como réus ou testemunhas que se apresentaram em trajes civis. Com a desculpa dos coronéis de que foram fardados porque estão na ativa.
Os réus que fracassaram na tentativa de golpe, que foram um fracasso na execução do plano a eles atribuído e que voltaram a fracassar ao não conseguirem esconder os crimes que planejaram, esses réus pretendem continuar apresentando-se como militares defensores da pátria.
Humilham a própria farda num momento em que a pátria do bolsonarismo que os mobilizou para o golpe é a pátria americana, e não a brasileira sabotada pelas chantagens do neofascista Donald Trump.
É péssima a situação de quem usa fardas hoje no Brasil, e pior ainda para os que são acusados da autoria de um golpe que, apesar do ardor patriótico, não deu certo.
- Imagem gerada em IA