
A conversa ficcional de Lula e Trump

O telefone toca no gabinete do presidente brasileiro, no Palácio do Planalto, Lula bota o dedo na boca, exigindo silêncio – apesar da plateia alvoroçada. É uma videoconferência. As bandeiras de cada país ao fundo, compondo cenário. Celso Amorim parece ter instalado uma sauna dentro do terno. Mauro Vieira parece em transe, como se estivesse em um sonho psicodélico, luzes fluorescentes piscando do teto, as mãos tremem levemente. Haddad tenta, na última hora, passar gráficos a Lula, que rejeita e faz cara feia.
O ambiente cheira a café frio e cheiros de peido circulam no ar. O barulho do ar‐condicionado, normalmente imperceptível, agora soa como helicópteros sobrevoando o Vietnã e jogando napalm. Não há espaço para erros. Não se ouvia “O vôo das Valquírias”, só Lula murmurando o hino do Corinthians.
Ligação atendida, vozes abafadas, no início, com interrupções ocasionais de linha, ficando claro que ambos estão, obviamente, gravando. Para ouvidos atentos, nota-se, vez por outra, o espocar de flashes, para confirmar que a conversa histórica e absolutamente improvável estava realmente acontecendo. Ricardo Stuckert, do lado de cá, Daniel Torok, do lado de lá.
Intérpretes profissionais fornecidos pelos serviços diplomáticos dos dois países tornam o diálogo quase instantâneo, fluido, como se os dois mandatários falassem a mesma língua.
Lula começa com voz calma.
— Camarada Trump, aqui é Lula. Obrigado por me atender, apesar dos pegas das últimas semanas. Mas química não se discute, quando rola, temos que obedecer nossos instintos…
O tradutor se vira. Lula ouve uma risadinha contida ao fundo.
– Espero que possamos conversar com clareza, a gente fala o que vem à cabeça, mas temos um país por trás. Não vamos virar melhores amigos, até pra não deixar o Milei com ciúmes, mas queremos defender nossos povos. Cada um do seu jeito. Um nordestino de Garanhuns e um empesário de Nova Iorque.
Trump responde com alguma gravidade:
– Presidente Silva….
– Lula.
– Presidente… Lula. Falo com o senhor por obrigação diplomática. Claro, tem mais coisa envolvida. Temos divergências fortes, que não se apagam com palavras doces. Mas ouvi que o Brasil exige agora “respeito”. Estou aqui por isso.
– Certamente não foi um conselho do Eduardo Bolsonaro.
– Quem?
– O bananinha… O filho do Jair que tá morando aí… esquece.
Lula sugue.
– Presidente Trump, exigir respeito não é crime. Mas aplicar tarifas de agiota sobre produtos brasileiros, que o cidadão americano consome, fere o comércio justo. E seu eleitorado. Os americanos mantêm um superávit comercial robusto com o Brasil nos últimos 15 anos, e ainda assim é tratado como “vilão comercial”.
Breve pausa.
– O sr não toma suco de laranja?
– Todo dia. Tentei umas “juice boxes”, mas são um soco no estômago. O suco de vocês é…bom demais.
Lula suspira.
– Presidente…. Lula, os EUA tomaram essas medidas porque acreditamos que há práticas desleais – subsídios ocultos, regulações protecionistas, e ainda interferência política dessa sua Suprema Corte. O careca parece o Lex Luthor. O senhor sabe que é simbólico posar de Super-Homem para nossos eleitores.
– O careca não é o problema, é o de peruca do Liberace. O sr está julgando caráter por cabeleira.
– Lula, nossos eleitores querem que eu pose de foda. Sou o xerife e o anticristo.
Lula suspira.
– Sei que o Brasil tem umas Forças Armadas, com o perdão da palavra, de merda, vocês não são uma ameaça. Não são o Irã, a Coréia do Norte. Mas tenho que manter minha fama de mal. Se eu flerto contigo, daqui a pouco o Maduro sai do bunker e me….
Lula interrompe para poupa-lo do constrangimento.
– Companheiro, só não mistura negócios, que são bons pra vocês, com política. Só eu sei o que é aguentar o Bolsonaro. O filho dele já te deixa louco. Faz o seguinte…
Trump, pensando na gravação, pede:
-Para com isso de companheiro, tá parecendo um papo meu com Fidel.
Trump sorri baixo, não sabe se a piada deu certo.
– Suspende temporariamente essas novas tarifas até podermos negociar, ponto a ponto — setor por setor — e que que essas revisões sejam feitas por técnicos, não pelo Rubio, tenha a santa paciência.
– Tá, posso considerar, se houver garantia de compromisso concreto. Não queremos um acordo que pareça que arriei as calças
– Então vamos negociar: começo aceitando abrir a lista dos produtos atingidos – mostrar onde pode ter distorção -, e criamos mecanismos de compensação ou desoneração gradual.
– E vocês tem lítio, nióbio, níquel, terras raras…
Lula quase sentiu os olhos de Trump brilharem. Mas Trump não esperava uma resposta, só queria pontuar. E segue:
– OK, esse é assunto pra outro papo. Não prometo encaminhar aos meus assessores a reavaliação das sanções à luz desse diálogo.
– Rubio, não. Sputnik – digo, Lutnick -, não. Técnicos.
– Vamos ver onde chegamos.
– Até breve, Lula.
– Até a Malásia.
– Pode ser. Ou quem sabe aqui, ou aí. A COP 30 tá chegando.
– Muito mosquito, Lula. Não força a amizade.
- Imagem gerada em IA