
Filantropia de Chapéu Alheio

O deputado Luiz Carlos Motta (PL-SP) apresentou um projeto de lei para isentar eventos beneficentes do pagamento de direitos autorais ao Ecad. A ideia parece nobre à primeira vista: afinal, quem poderia ser contra a filantropia? Mas, quando olhamos com mais cuidado, percebemos que a proposta não passa de injustiça disfarçada de boa ação.
Em qualquer evento beneficente, todos os custos são pagos. O cachê dos artistas, os músicos, a equipe técnica, o aluguel do palco, o som, os andaimes que montam as estruturas, as luzes, os seguranças, os banheiros químicos… tudo é pago. O único item que, segundo o projeto, poderia ser usado “de graça” seriam as músicas. Justamente a razão de existir de um show. Usar a obra de alguém sem pagar por ela, enquanto todos os outros envolvidos no evento continuam recebendo é, no mínimo, uma injustiça.
O equívoco é grave: autores vivem de direitos autorais. É o que paga suas contas, sustenta suas famílias e financia a própria criação de novas músicas.
Na canção Pop Zen, gravada por Arnaldo Antunes e composta por Alexandre Leão, Lalado e Manuca Almeida, há um refrão ótimo que diz que “só é seu aquilo que você dá”. Caridade com o suor alheio não é solidariedade. É exploração com verniz de bondade. Não é justo pretender ser generoso quando a conta vai para os outros.
Quem deve decidir se doa ou não sua parte é o próprio autor. Muitos compositores, aliás, já destinam seus direitos para causas sociais, mas isso é escolha individual, não obrigação imposta por lei. É importante frisar: ninguém é contra ações sociais. Pelo contrário. Mas se a ideia é realmente fortalecer causas filantrópicas, que se incentive a doação voluntária de quem pode abrir mão, não que se crie uma lei retirando dos autores sua justa remuneração.
Compositor não vive de vento, deputado.
Como diria o saudoso poeta Fernando Brant, o autor existe.
A proposta, na prática, não passa de apropriação indébita disfarçada de filantropia.
- Imagem gerada a partir de IA