Imigrantes brasileiros aderem greve geral contra reforma trabalhista em Portugal

8 de dezembro de 2025, 10:08

Trabalhadores de diversos setores vão aderir à greve geral marcada para quinta-feira (11/12) em Portugal contra a proposta de reforma trabalhista apresentada pelo governo de Luís Montenegro. É esperado que imigrantes, incluindo brasileiros, participem do ato.

Se aprovado, o pacote laboral proposto pela gestão direitista pode trazer retrocessos aos direitos de quem vive do próprio trabalho. Os imigrantes, por exemplo, representam atualmente 13,4% da força de trabalho formal no país.

Diante de mais um cenário de alerta para os imigrantesOpera Mundiacompanhou o encontro de trabalhadores brasileiros realizado na quarta-feira (03/12), na sede da União dos Sindicatos de Lisboa. O objetivo foi compreender e esclarecer os impactos concretos do pacote laboral na vida desses trabalhadores. A reunião contou com o apoio do Núcleo do Partido dos Trabalhadores (PT) de Lisboa.

Segundo o brasileiro Regis Barbosa, presidente do Sindicato dos Trabalhadores de Arqueologia (STARQ), muitos imigrantes, assim como a generalidade dos trabalhadores, serão afetados pelas alterações que o governo do primeiro-ministro Luís Montenegro pretende aprovar, após ter sido reeleito sem mencionar o tema durante a campanha.

Regis afirma que um dos pontos mais graves da proposta é o fim da obrigatoriedade de reintegração do trabalhador quando é comprovada a ilegalidade da demissão por justa causa. Segundo ele, o contrato de trabalho e os descontos contínuos à Segurança Social são indispensáveis para garantir a permanência regular no país.

“A revogação dessa obrigatoriedade pode facilitar demissões ilegais, especialmente nas pequenas e médias empresas, que predominam em setores como o meu. Trabalhadores com muitos anos de serviço ficariam ainda mais vulneráveis a dispensas baseadas em alegações falsas, como baixa produtividade, insubordinação ou atividade sindical, aumentando a precariedade e a insegurança”, disse.

Já Pedro Prola, coordenador do Núcleo do PT em Lisboa, avalia que as reformas neoliberais impõem um processo que visa reduzir os custos do trabalho, o que, na prática, significa uma redução real dos salários. Segundo ele, a criminalização da imigração segue a mesma lógica: trabalhadores imigrantes com direitos reduzidos tornam-se mais suscetíveis a condições degradantes de trabalho e mais vulneráveis a redes de tráfico de pessoas, já que muitos deixam de denunciar abusos e violações por medo de deportação.

“Por isso, aquilo que tem sido apresentado como políticas para controlar a imigração e valorizar os trabalhadores nacionais acaba por produzir o efeito contrário, contribuindo para a precarização das condições de trabalho e para a redução do custo da mão de obra. São temas fundamentais para o debate entre os trabalhadores brasileiros em Portugal e, de forma mais ampla, entre as organizações que representam a classe trabalhadora”, afirmou.

O técnico de comunicação Jorge Filho falou sobre a importância de mobilizar a comunidade brasileira em um contexto de alta precarização e apatia política. Como ativista do movimento Porta a Porta, pelo direito à habitação, ele explica que essa realidade faz com que a greve geral não esteja “na ordem do dia” para muitos, apesar de ser vista como um “ataque orquestrado” aos direitos de todos.

“Nós vivemos e trabalhamos aqui. Temos de nos preocupar mais com a realidade das nossas vidas em Portugal. Enfrentamos problemas que atingem a todos, como a crise na educação, no transporte, na saúde e na habitação. Sempre haverá recortes específicos que precisam ser enfrentados, mas isso só se conquista com luta cotidiana. É claro que é importante acompanhar o que acontece no Brasil, mas precisamos nos fortalecer aqui e nos unir em torno dos problemas comuns”, disse.

Integração x precariedade

Em dezembro de 2024, segundo dados da AIMA, cerca de 490 mil brasileiros residiam oficialmente em Portugal, um aumento de 31,5% em relação ao mesmo período do ano anterior. Esse número, no entanto, não inclui aqueles que obtiveram a cidadania portuguesa ou possuem dupla nacionalidade. Já o Itamaraty apontava, em janeiro do ano passado, um total oficial de 513 mil brasileiros em solo português.

A chefe de cozinha Bianca Ribeiro, que vive em Portugal há 11 anos e atua no setor desde 2017, relatou à reportagem que os trabalhadores imigrantes já representam 32% da mão de obra na área. “Nesta semana, durante a distribuição do aviso de greve, fomos expulsos da cantina de uma associação de estudantes. Por outro lado, fomos muito bem recebidos na cantina da própria Universidade, onde a maioria dos trabalhadores são mulheres imigrantes com autorização de residência e sem cidadania”.

Como dirigente sindical, Bianca também chama a atenção para os riscos que a falta de integração dos imigrantes representa para toda a classe trabalhadora. Segundo sua experiência, há grande dificuldade de ser ouvida, inclusive em instituições criadas para proteger os direitos dos trabalhadores, independentemente do idioma falado.

A última paralisação que uniu a Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses (CGTP) e a União Geral de Trabalhadores (UGT), as duas maiores centrais sindicais do país, ocorreu em junho de 2013, durante o período da “Troika”, quando os índices de desigualdade social em Portugal dispararam. De acordo com a Rede Europeia Anti-Pobreza, os trabalhadores portugueses ficaram 25% mais pobres naquele contexto.

João Barreiros, da Comissão Executiva do Conselho Nacional da CGTP, disse ser saudável e legítimo o debate aberto sobre aquilo que afeta e preocupa todos os trabalhadores. Ao relembrar as 110 mil novas sindicalizações realizadas em 2024, destacou medidas como a ampliação do acesso à informação por meio da tradução de materiais e documentos para outros idiomas.

“A realidade que vivemos há mais de 50 anos comprova a importância da nossa presença e da nossa intervenção a partir dos locais de trabalho. No início do ano passado, promovemos uma formação para dirigentes sindicais, focada especialmente no atendimento a imigrantes que falam outras línguas. Por isso, é preciso buscar o que nos une, porque o que nos divide não falta. Este pacote de medidas tem de ser derrotado. E, se no dia 11 de dezembro a resposta do governo não for essa, a luta continuará”, afirmou.

Imagem: Opera Mundi

Escrito por:

Radicada em Lisboa, é jornalista correspondente de Opera Mundi e escreve em veículos como Jacobin Brasil, Jornal Expresso e Rádio TSF Portugal. Atuou em redações como Revista Brasil Já e Sapo Mag, além de contribuir para diversos meios, entre eles Brasil de Fato, ICL Notícias, Brasil 247, DCM, Correio Braziliense e Rádio Bandeirantes. Cobriu conflitos como as guerras da Ucrânia e do Líbano, as eleições presidenciais na Rússia, as eleições judiciais no México e a Cúpula do Brics, em Kazan e no Rio. Seus principais focos são guerras, conflitos, direitos humanos, migrações, habitação, política e cultura.

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