
A reabilitação de Mamãe Falei no MBL e o sonho do caçador de ucranianas em virar presidente
O youtuber Arthur do Val, conhecido como Mamãe Falei, parecia politicamente enterrado. Teve o mandato cassado pela Assembleia Legislativa de São Paulo, em maio de 2022, após vazarem áudios sexistas repugnantes, gravados durante a Guerra da Ucrânia – para onde se mandou para suposta “ajuda humanitária” – sobre mulheres e refugiadas. Do Val gravou áudios a amigos para explicar como seria “fácil pegar mulheres ucranianas, porque são pobres”. Do Val Passou, que já passou pelos partidos DEM, Patriota, Podemos e União Brasil, anunciou, na época, em vídeo nas suas redes sociais, que estava saindo do agrupamento golpista Movimento Brasil Livre (MBL). Seu rosto sumiu do site e produtos seus, que eram vendidos na lojinha virtual do MBL, foram pro encalhe. Nada como um dia depois do outro, além de ter como amigo leal o deputado federal Kim Kataguiri, coordenador nacional dessa escória. De fininho, Do Val foi voltando e já está reabilitado pelo MBL, que o coloca na capa do site, como um dos porta-vozes, numa foto ao lado de Kim, Renan Santos, outro sócio-fundador, e Matheus Faustino, apresentado como vereador de Natal e “bodybuilder”.
Retirado do isolamento político, Do Val, acredite, sonha agora em ser candidato a presidente em 2026. O MBL pretende realizar uma prévia entre o ex-deputado estadual Arthur do Vale o empresário Cristiano Beraldo, comentarista da Jovem Pan, para decidir quem será o seu candidato à Presidência da República em 2026. O vencedor seria lançado por um partido batizado de Missão, e que, sabe-se lá porquê tem como símbolo uma onça pintada. Arthur do Val está inelegível até 2030 e tenta reaver seus direitos políticos. Líderes do MBL afirmaram ter conseguido as assinaturas necessárias para a criação da legenda. De acordo com o grupo, foram coletadas mais de 800 mil fichas até o momento – vale uma boa auditoria em quem tem o histórico do movimento. A expectativa é que o partido nasça em 2025 para disputar eleições para o Congresso, governos e Presidência no ano seguinte. As redes sociais de Do Val e Beraldo, cada vez mais ativas, são duas usinas de fake news.

Em seu perfil no site do MBL, Do Val é descrito assim: “Empresário, Youtuber e Jornalista. Fez 10% para prefeitura de SP em 2020. Foi 2⁰ Deputado Estadual mais votado de SP em 2018. Eleito por 500 mil paulistas, cassado pelo sistema”. Ah, o “sistema”, pronto, já tem slogan de campanha. Perdeu a humildade de quando se despediu do MBL, pedindo desculpas, admitindo seus erros e tentando se reconciliar com a namorada que, na época, vazou. O caçador de ucracianas também aparece em várias fotos, na timeline que conta a história do movimento. Seus produtos também voltaram para as prateleiras, como um livro chamado “Ravier com J”, supostamente escrito por ele, sobre “uma jornada pessoal de um músico talentoso”, e vendido a R$ 59,90. Também aparece como modelo, vestindo uma camiseta azul da “Academia MBL” – um cursinho caça-níqueis que promete ser uma fábrica de novos líderes e “intelectuais”. Sai pela bagatela de R$ 40,00.


O MBL, visivelmente desidratado, e que encolhe ano a ano, usa, publicamente, a estratégia das provocações de parlamentares de esquerda para tentar ganhar holofotes. Foi a bunda de um dos militantes do MBL que o deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) chutou, expulsando-o do Congresso pela porta dos fundos, depois de ser insultado sistematicamente, inclusive com ofensas dirigidas à sua mãe. O Partido Novo aproveitou a deixa e continua insistindo na cassação de Glauber. Enquanto não entra para a poeira da história, o MBL vai fazendo seu barulhinho ruim.
Como surgiu o MBL
Defensor do “liberalismo econômico e do republicanismo”, o MBL viveu seu apogeu entre o final de 2014 e 2016, servindo de massa de manobra para o PSDB e para a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), promovendo protestos a favor do impeachment de Dilma Rousseff- como o tosco Vem Pra Rua. Em entrevista à Época, em 2018, o sociólogo espanhol Manuel Castells, autor do livro “Ruptura: a crise da democracia liberal”, e um dos maiores estudiosos das transformações sociais causadas pela internet e pela vida na rede, chamou o MBL de “força não democrática”, financiada em suas origens, no Brasil, pelos irmãos Koch (Charles e David Koch, bilionários americanos conhecidos por abastecer, no nascedouro, movimentos de extrema-direita). Isso já havia sido revelado pelo inglês The Guardian, que contou que alguns coordenadores do MBL receberam treinamento da Students for Liberty, uma rede que advoga o livre mercado e faz parte da Atlas Network, organização americana que difunde esses ideais. Deu no que deu.
Imagens do site do MBL, da Alesp/Divulgação e vídeo do JosiTV Podcast