Brasil Paralelo: Netflix negacionista entra em promoção de 10 reais por mês. Mas já tem novos projetos e prepara sua primeira série infantil.

26 de maio de 2025, 13:05

“Saída pela direita”, diria o Leão da Montanha – peraí, o bordão mais comum do leão cor de rosa de colarinho, gravata e punho, parte do inesquecível acervo da Hanna-Barbera, era “saída pela esquerda” – não que isso faça diferença agora. A Brasil Paralelo Entretenimento e Educação S/A, mais conhecida por Brasil Paralelo, empresa fundada em 2016, em Porto Alegre, que produz vídeos sobre política e história, baseando-se e utilizando um viés, digamos, de anti-história, desbrava novos caminhos. Com “documentários” para adultos na base do “inventa o que quiser”, baseado em narrativas de direita que tentam entortar a história a seu favor, resolveu diversificar e mentir também para crianças. E por que não vender mentiras na fonte: para o público miúdo, as futuras novas gerações. Lavagem cerebral na raíz. Daí nasceu a série “Pindorama”, a primeira animação original BP voltada para o público infantil. Não há limites.

O Brasil Pararelo tem o orgulho de entrar agora na mente das crianças: vai estrear sua primeira série infantil, uma produção “com o objetivo de promover a coragem, a honra e o orgulho pelo Brasil”. Imagens do site.

Não tem como esse lixo não cruzar seu caminho, nem que seja por instantes, se você navega nas redes, bombardeado ao entrar nas plataformas da Meta. A Brasil Paralelo gasta milhões com anúncios nas redes sociais para espalhar desinformação e negacionismo. Entre agosto de 2020 e junho de 2024, a empresa investiu R$ 24,5 milhões em propagandas. Mais: a Brasil Paralelo, que não deve viver exatamente só de assinaturas, está em promoção. Enquanto todos os canais do streaming só aumentam preços – e agora incluem propagandas repetitivas e chatérrimas no meio dos filmes, para quem assina planos básicos – sabe aquilo que achávamos que nos livraríamos na era do streaming, eliminando os anúncios? – , o fenômeno BP foi na contramão: está oferecendo um plano de R$10 por mês – o mais barato do mercado. Como a direita é “boazinha”, parafraseando Kate Lyra.

Lixo direitista em promoção: “Assine a Brasil Paralelo por apenas R$10/mês. Liberando o acesso a mais de 100 produções originais, incluindo “MST: Terra Prometida” e “Oficina do Diabo”, o primeiro filme da Brasil Paralelo. Os planos vão a até R$ 32,30 por mês. Imagem do próprio site.

Investidor “anjo” – e rico

Com alardeados – nunca provados- 600 mil assinantes, o portal da produtora Brasil Paralelo se projetou como uma Netflix negacionista. A história oficial de que os pais fundadores usaram aproximadamente R$ 13 mil do próprio bolso e empréstimos, não bate. Explicamos: a Brasil Paralelo logo contou com a ajuda de um “investidor anjo”: nada menos que Jorge Gerdau Johannpeter, empresário gaúcho, que repassou pelo menos R$ 1,5 milhão à produtora. Ele é ex-presidente da maior maior siderúrgica do Brasil, que leva seu sobrenome, a Gerdau, onde esteve listado como conselheiro até 2021. É atualmente presidente do conselho superior do Movimento Brasil Competitivo (MBC). E é presidente do conselho superior do Movimento Brasil Competitivo (MBC), outro lobby congressista.

“Investidor anjo”: Jorge Gerdau Johannpeter, dono da Gerdau, empresário gaúcho repassou pelo menos R$ 1,5 milhão à produtora Brasil Paralelo. Foto: Divulgação.

A empresa nativa, que foi reformatada, em 2021, como LHT Higgs Produções Audiovisuais LTDA, por Lucas Ferrugem de Souza, Henrique Leopoldo Damasceno Viana e Filipe Schossler Valerim, cinco anos depois alterou sua constituição e seu nome para Brasil Paralelo Entretenimento e Educação S/A. Estava garantido o investimento para a virada definitiva. O rebranding da produtora passa, atualmente, por um novo ajuste; quer se desvincular da fama de “streaming bolsonarista” – para quem já prestou grandes serviços -, com a queda na imagem do quase preso ex-presidente, e agora está feliz como “streaming de direita” mesmo.

Lucas Ferrugem de Souza, Henrique Leopoldo Damasceno Viana e Filipe Schossler Valerim, os “pais fundadores” da produtora, associada à ideologia bolsonarista, inspirada em vídeos do Olavo de Carvalho, mas que agora que ser “só” um canal de direita. Foto: Divulgação.

A Brasil Paralelo também engaja suas produções em conteúdos que tentam influenciar em campanhas sociais, especialmente com viés moral ou religioso. Como sua luta contra o direito ao aborto, usando e abusando dos sentimentos e da fé das pessoas. Propagam em larga escala falácias sobre os direitos reprodutivos, suscitando culpa entre as mulheres. Usando a manjada linguagem da “defesa da vida”, criaram um cabo de guerra com defensores de direitos humanos e feministas.  O documentário “Duas Vidas”, da Brasil Paralelo, que estreou em outubro de 2023 – logo após o STF começa a tratar do tema-, compara o aborto a genocídios e ao holocausto comandado por nazistas. Na época da pandemia, a empresa entrou no foco da CPI da Pandemia no Congresso, por conta de sua suposta “influência na radicalização política adotada pelo Palácio do Planalto”, conforme apontava o pedido de investigação dos senadores. 

A produtora tem outras produções audiovisuais com temáticas antigênero. Em outubro de 2022, o Tribunal Superior Eleitoral decidiu desmonetizar o canal de YouTube da Brasil Paralelo até o final do segundo turno das eleições. Seu documentário “Quem Mandou Matar Jair Bolsonaro?”, peça de propaganda política, foi classifificado como mera desinformação, com ataques à candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva. Entre outras “obras originais” estão “MST: Terra Prometida” – não pense que defende os sem-terra, né -, “Histórias do Comunismo”, “Pátria educadora”, “O teatro das tesouras”, “Direita no Brasil”, “Invasão Bolchevique” e “1964, entre armas e livros”.

Documentários da Brasil Paralelo – os títulos já entregam as intenções. Foto: Produção Brasil Paralelo.

Quais os rumos da Brasil Paralelo, nossa Netflix de direita? Eles tem buscado entender melhor – quem fica com eles, considerando a segmentação de mercado e consumidor. O maior grupo de assinantes está na faixa de renda alta, os consumidores mais abastados, representam uma grande fatia do mercado-alvo – daí o teste do “produto barato” agora a R$ 10 por mês, que não tem como se sustentar. Talvez, dizem analistas desse nicho, a ideia seja avançar, e se consolidar, na extrema-direita, com documentários que enaltecem o papel do agronegócio e negam sua influência no aquecimento global, por exemplo. Sua agenda é clara: promover ideias ultraconservadoras – e lucrar com isso. Os conteúdos deixam evidente que a produtora se opõe à esquerda e “ideias progressistas”.

Fora a Gerdau, a Brasil Paralelo, que afirma ser apartidária, conta com Ricardo Gomes, ex-vice-prefeito de Porto Alegre e filiado ao Partido Liberal, o PL, apresentador do programa Magna Carta. Em seu mestrado, a historiadora Mayara Balestro identificou um núcleo duro de intelectuais que mais marcam presença nas produções da Brasil Paralelo ao longo do tempo – todos eles de direita. Personalidades como o deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança, hoje no PL de São Paulo, Helio Beltrão, do Instituto Millenium e Mises Brasil, e influenciadores como Flavio Morgenstern e Leandro Ruschel. Jair e Eduardo Bolsonaro também eram presenças frequentes, segundo o levantamento de Balestro. Mais recentemente, foram escanteados. O deputado federal Marcel Van Hattem, do Novo gaúcho, é o novo darling do BP. Nas últimas eleições, Pablo Marçal, então candidato à prefeitura de São Paulo, foi uma das estrelas do programa de entrevistas da produtora. Tutti buona gente!

Imagens: site do Brasil Paralelo e fotos de divulgação

Fontes: Apuração própria mais Intercept Brasil

Escrito por:

Jornalista há 40 anos, já foi repórter e editor nos maiores veículos do país - O Globo, Jornal do Brasil, Folha de S.Paulo, Correio Braziliense, Istoé - assessor de imprensa, analista sênior de informações e/ou ex-diretor de agências de comunicação corporativa - FSB Comunicação, Santafé Ideias, entre outras -, ex-professor de Jornalismo da PUC-RJ, trabalhou no Senado Federal e na Prefeitura do Rio. Já foi assíduo colaborador dos sites Os Divergentes e DCM. E criador, com meu irmão Paulo Henrique, da revista cultural Tablado, que durou 20 anos a acabou na pandemia. Premiado, entre outros, com Prêmio Esso, Embratel e Herzog. E, PRINCIPALMENTE, pai do Bruno e da Gabriela, orgulhos da minha vida.

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