Ganha destaque a prosperidade feminina no ambiente de machos centralizadores e mandões.

Compadres e comadres estão em polvorosa: Janja não para de falar

19 de maio de 2025, 19:30

Mulheres e homens atormentados, sincera ou cinicamente, pelo atrevimento das perguntas feitas por Janja em Pequim devem buscar o conforto das convenções e das normalidades. Vejam onde procurar bons exemplos.

A revista Exame tem apresentado com insistência modelos de mulheres gestoras e/ou empreendedoras que avançam, passam a mandar e até ficam ricas em cenários masculinos. É uma tendência antiga, mas nunca como agora.Play Video

Ganha destaque a prosperidade feminina no ambiente de machos centralizadores e mandões. São mulheres que cuidam do marido, da casa, dos filhos e do empreendimento a que se dedicam, como executivas ou como donas dos negócios.

O que elas fazem é, quase sempre, a reprodução dos métodos dos homens, mas com toques e jeitinho femininos. É bom, é do que o mundo precisa em todas as áreas, e não só a economia. Mas não é transgressor.

Mulheres empreendedoras trabalham para ganhar dinheiro, o que é legítimo. Mas dificilmente afrontam convenções no que essas têm de mais inflexível. Não vislumbram nada à margem do empreendedorismo e raramente questionam estruturas de poder.

Em outros campos, inclusive o da política, há as que ocupam espaços para reproduzir os modos da direita, com tradição, família, propriedade, Deus acima de tudo e, se possível, com bala e boiada.

E há as mulheres que incomodam, transgridem e provocam desconforto, geralmente à esquerda. Janja passou a ser atacada por homens e mulheres por ter saído, em um meio cheio de regras e limites, do modelo do ativismo consentido que ganha aplausos dentro de famílias, empresas, instituições, governos e partidos.

O novo figurino de Janja é não ter figurino. E isso incomoda um mundo que faz apenas concessões, inclusive na imprensa, desde os compadres e as comadres da GloboNews, que se aliaram aos homens da corporação, à velha direita e ao novo fascismo porque são recatadas. Janja precisa ser contida.

Mas o que ela manda dizer, depois do cerco do machismo, que não teria feito o mesmo com um homem – se um macho tivesse levantado a questão do TikTok em Pequim –, é que não vai ficar quieta.

A mesma Exame que exalta as magias da prosperidade feminina noticiou a reação de Janja e deu destaque nessa segunda-feira, em sua versão online, ao recado dela de que não vai se calar.

Mas não esperem que a Exame ofereça a Janja o espaço, em manchete de capa, que concede a empreendedoras descobridoras de novas formas de fazer e vender comida saudável para bebês, de levar grifes do Texas para o agro pop do centro-oeste e de oferecer diplomas que legitimam, por exigências do mercado, a atividade de quem já sabe o que faz.

Capas de revistas são para quase transgressões aceitáveis, bem calculadas, de acordo com os protocolos feitos pelos homens. Janja é de outro time e foi longe demais ao fazer perguntas a Xi Jinping. Era preciso atacá-la, para atacar Lula.

Mas a socióloga não vai desistir, pelo que disse em discurso na abertura da Semana Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes. Acharam que Lula iria mandar a primeira-dama calar a boca, e Janja foi ao evento para avisar:

“Não há protocolo que me faça calar se eu tiver uma oportunidade de falar sobre isso com qualquer pessoa que seja, do maior grau ao menor grau, do mais alto nível a qualquer cidadão comum”.

Quem da mídia das corporações dará capa para que Janja fale da pauta de Pequim? Quais são as publicações, editadas por homens ou mulheres, que não temem o que Janja pensa, não sobre como ganhar dinheiro com novas comidinhas para crianças, mas sobre a exploração financeira e sexual de crianças pelos adultos nas redes sociais? Não esperem essa capa.

Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil

Fonte: Brasil 247

Escrito por:

Moisés Mendes é jornalista de Porto Alegre e escreve no blogdomoisesmendes. É autor de ‘Todos querem ser Mujica’ (Editora Diadorim). Foi editor de economia, editor especial e colunista de Zero Hora.