Um círculo vergonhoso prepara 2026

28 de junho de 2025, 22:30

Para os que não assinam ou não têm obrigação de ler os jornalões, como nós, do ramo, eu resolvi reproduzir, porque apenas comentado não se tem noção de até onde está indo a intenção de destruírem as instituições nesse país e colocar logo a placa: “sob nova direção”.

“Mais da metade dos brasileiros diz ter vergonha dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), aponta pesquisa Datafolha. Segundo o instituto, o índice daqueles que declaram ter orgulho do tribunal é de 30%, enquanto o de vergonha bate em 58%”.

E aí, tal como a colega Helena Chagas (cascuda de ver as reviravoltas de Brasília), postou no X, eu pergunto: mas com que intenção alguém elabora perguntas que induzem pessoas a refletir sobre tal questão?

E aí os fofos explicam: “A pesquisa perguntou aos entrevistados se eles tinham “mais orgulho do que vergonha ou mais vergonha do que orgulho” de uma série de instituições, grupos e pessoas”.

Ah! Entendi. E isso nesse momento contribui para quê??? Me pergunto. (Certamente para fazer com que o ministro Flávio Dino fique vermelho, constrangido, e pare de investigar as emendas impositivas) …

Mas vão além: “Os três Poderes amargaram índices de vergonha similares, com 56% declarando o sentimento a respeito do presidente Lula (PT), 58% pelos deputados atuais, e 59%, pelos senadores”.

Só falta contratarem a Sandra de Sá para entoar o refrão de seu grande sucesso: “ô joga fora no lixo! Ô joga fora no liiiixo”.

A propósito, com o fito de passar o máximo de credibilidade, esclarecem ao distinto público:

“O Datafolha entrevistou 2.004 pessoas em 136 municípios em 10 e 11 de junho. A margem de erro da pesquisa é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos”.

Ou seja, “alugaram a paciência” de mais de duas mil pessoas para montar um cenário que leva a população a pensar no que ela não queria, a constatar o que não contribui para nada, a não ser para manter em fogo brando a ideia de que está tudo ruim, nada presta, vamos botar tudo abaixo porque só uma guinada à direita constrói. É isso mesmo?

Não apenas. A um ano e meio das eleições de 2026, já há um jogo sendo jogado desde o início do ano, mas que se intensifica, à medida que o tempo avança. Como já escrevi e comentei aqui, no 247, se em 2018 a mídia tradicional fez pressão para tirar Luiz Inácio Lula da Silva da disputa, abrindo espaço para um candidato da ultradireita – Jair Bolsonaro é fruto do trabalho intenso da mídia naquele momento -, desta vez ela não quer errar de novo e se expor. Delegou.

Nada de fazer carga direta e aberta em seus noticiosos, contra o governo de turno.

Desta vez, há uma estratégia bem montada. Sim. Estratégia. Empresas de lobby, como por exemplo a “Esfera”, promovem tardes de debates, chamando figurinhas carimbadas – toda a corriola neoliberal – para palestrar e expor suas teses/reivindicações (com apoio ou em parceria com grandes jornais: Valor, O Globo, Estadão e Folha. No dia seguinte, essas opiniões estão estampadas nas páginas ou ilustrando lives de seus comentaristas).

Monta-se o noticiário a partir do que foi dito e defendido nas tardes regadas a boa bebida e canapés sofisticados. Todo esse conteúdo é jogado para a sociedade. E tome de ideias de interesse da elite. Foi assim que soubemos de pérolas como a defendida pelo ex-presidente do Banco Central e atual megainvestidor, Armínio Fraga. Sem corar, receitou: seis anos de congelamento do salário-mínimo e as contas públicas estariam resolvidas. Ou a mais nova: é preciso promover uma “mudança estruturante” – está na boca de nove em cada dez comentaristas, a expressão -, que no duro significa: desatrelar o benefício dos aposentados do aumento do salário-mínimo. (Sempre ele, que já é mínimo, porque é destinado à base da pirâmide).

No bojo das receitas contra os desvalidos, vem também o dedo em riste para o governo gastador, pouco afeito a “ajustes” e a “cortar na própria carne”, outra fala que adoram. Pronto. Está montada semanalmente a cantilena que cai no Congresso, vira discurso e é repetida à exaustão nas redes, nos memes, nos grupos de zap, nas igrejas pentecostais.

Isso transforma o governo num verdadeiro saco de pancadas, principalmente no Congresso, onde deputados e senadores radicais da ultradireita embaralham o jogo, brecando projetos de interesse da sociedade. (É preciso criar indisposição da base contra o presidente Lula, que se bate pela redução das desigualdades e enfrenta ali uma turba estridente). E, ato contínuo, lançam no ar uma pesquisa.

É como um conjunto de vasos comunicantes. A, monta o seminário; B publica notícias sobre o pensamento neoliberal dos “iluminados”; C – leia-se comentaristas, badalam o conteúdo publicado. O lixão cai nas redes e lá vem o pelotão de pesquisadores colher o resultado do que foi ministrado na veia da sociedade incauta. “Aconteceu, vira manchete”.

Enquanto isso… Nos diversos canais de TV, repete-se à exaustão o nome do candidato dos sonhos, exibindo a ansiedade frente à indefinição da direita quanto a quem levarão para as urnas em 2026. A principal tarefa é desidratar Lula. E, para isso, como disse acima, há um jogo em curso que consiste no seguinte: o “pesquisismo”. Desta vez a mídia sai limpinha e faz cara de paisagem. Afinal, estão apenas noticiando o que as pesquisas colhem do que foi plantado. Um círculo vicioso. Ou melhor, vergonhoso.

Imagem gerada em IA

Escrito por:

Jornalista. Passou pelos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora-pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" e "Imaculada", membro do Jornalistas pela Democracia

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