
Nobel, um prêmio em busca de likes

A história é conhecida. Alfred Nobel, o criador da dinamite, se atormentava com o apelido de “mercador da morte”. Para contornar esta fama, criou o prêmio que leva seu nome. Em resumo: desde o início, o prêmio buscava aprovação pública.
Não por outro motivo, este prêmio é mais conhecido que aqueles que laureia. Dificilmente nos lembramos os nomes de quem ganhou um Nobel em química ou literatura dois anos depois da premiação. Alguns se lembram do Nobel de Economia, mais pela tendência de autopromoção dos economistas.
É fato que o Nobel da Paz é o de maior impacto público. Não por outro motivo, Trump fez uma enorme pressão infantil para receber o prêmio este ano.
Mas, o prêmio pouco diz para o mundo. Justamente porque ele foi feito como uma redenção pessoal.
O Nobel da Paz deste ano gerou mais polarização e troca de farpas que uniu a nossa espécie. Foi um tapa na cara de quem realmente acredita na possibilidade da paz.
María Corina Machado, a premiada deste ano, pode ser tudo, menos uma defensora da paz em seu país. Muito menos, defensora da paz mundial. Uma das líderes da oposição ao chavismo, é mais um desses personagens exagerados e caricatos que a oposição venezuelana cria aos borbotões. O estandarte deles é Juan Guaidó, que se autodeclarou presidente da Venezuela, num dos momentos de maior constrangimento político do mundo contemporâneo.
Guaidó e Corina usaram Edmundo González para se projetarem. Anunciaram que González havia vencido as últimas eleições contra Maduro e se projetaram. Como o Nobel, em que o premiado desaparece, mas o nome de quem concede o prêmio continua nas conversas de botequim, González sumiu em pouco tempo, mas Corina, indicada ao Nobel da Paz justamente pelo secretário de Trump, Marco Rubio (o mesmo que negocia, agora, com nosso chanceler), continua se autopromovendo.
O governo Maduro é ruim. Maduro, ele próprio, começou sua escalada no poder afirmando, para surpresa dos normais, que havia conversado com Chávez, recém-falecido, que havia se transmutado em pássaro. Naquele momento, já ficava nítido seu pendor a manipular as crenças populares de seu país. Maduro não é uma pessoa confiável ou preparada e Lula sabe bem disso.
Porém, a oposição venezuelana consegue ser ainda pior que Maduro. Não consegue se livrar da pecha de corrupta e oportunista.
Lembremos que a direita oposicionista que tem voto na Venezuela não é liderada por María Corina. A ultraliberal extremista María Corina rachou recentemente a unidade oposicionista ao promover a abstenção após questionar as eleições presidenciais de 2024.
A direita oposicionista que não seguiu Corina, contudo, dominou as 50 cidades em que Maduro não conseguiu eleger prefeitos (a Venezuela possui 335 municípios). Entretanto, ainda não possui uma liderança forte, esta permanente tragédia para a oposição venezuelana.
A oposição que tem voto é a da “Fuerza Vecinal” e do “Vamos Vamos Cojedes”. A primeira força lidera a zona metropolitana de Caracas. A segunda, as cidades do estado de Cojedes (são 23 Estados, na Venezuela), onde o grupo já tinha conseguido eleger um governador.
Enquanto a extrema-direita lançou o slogan “Eu já votei em 28” – em alusão a data das eleições presidenciais de 2024 –, a ala moderada da direita venezuelana incentivou o voto oposicionista.
Enfim, Corina não unifica ou pacifica nem mesmo o bloco oposicionista.
Ao contrário, Corina Machado apoiou golpes e intervenção armada na Venezuela. Apoiou o golpe de Estado que derrubou o então presidente Hugo Chávez por 48 horas em abril de 2002 e foi uma das 300 pessoas que assinou o documento conhecido como Decreto Carmona.
Em 2005, visitou a Casa Branca e se reuniu com o então presidente dos EUA George W. Bush, que havia apoiado e reconhecido o autoproclamado governo de Carmona. Há acusações de que Corina teria conseguido que os EUA financiassem a ONG Súmate, dirigida por ela.
Enfim, Corina não tem currículo para receber qualquer homenagem como defensora da paz.
O que nos faz retornar ao tema inicial deste texto: o Nobel é um prêmio que tem por objetivo a autopromoção de seu criador. Não me atrevo a ditar o futuro, mas é plausível que em breve tenhamos nos esquecido que Corina recebeu este prêmio. Porém, o nome de Nobel continuará sendo o mais conhecido dos prêmios internacionais.
Há algo de marketing analógico muito bem-sucedido neste Prêmio Nobel. Merece até mesmo um estudo para entendermos como se projeta sem qualquer indício de manipulação de algoritmos.
Neste sentido, premiar quem não merece, mas busca a exposição pública, tem alguma ciência.
- Imagem gerada em IA