O cerco está fechando

27 de agosto de 2025, 07:19

Do dia 02 ao dia 12 de setembro, Jair Bolsonaro suará frio. A boca, possivelmente, secará em vários momentos, a respiração ficará mais acelerada. Dado que se trata de um conhecido paranoico, a ansiedade poderá criar a ideia de que está à beira do pânico. Em alguns momentos, toda esta sensação de desmoronamento deverá ser substituída por uma raiva devastadora e o sentimento de justiça se misturará ao desejo do chão se abrir e tragar a tudo e todos.

Essa suposição épica tem algo de verossímil, dado que Bolsonaro já demonstrou tantas vezes que é assim que pensa e age. Aliás, é justamente por externar seus sentimentos desta forma que está no banco dos réus.

No dia 2, a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal iniciará o julgamento da Ação Penal (AP) 2668, que tem como réus o denominado “Núcleo 1” ou “Núcleo Crucial” dos acusados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por tentativa de golpe de Estado ocorrida entre 2022 e 2023. O julgamento será presencial e estão reservadas cinco datas para suas sessões: 2, 3, 9, 10 e 12 de setembro.

Tudo começará com a leitura do relatório do caso pelo ministro Alexandre de Moraes. Em seguida, o procurador-geral da República, Paulo Gonet terá até duas horas para sua manifestação. Depois, as defesas apresentarão sustentações orais, começando pela defesa de Mauro Cid.

Encerradas as manifestações, o ministro Alexandre de Moraes apresentará seu voto. Conforme o Regimento Interno do STF, os demais ministros votam em ordem crescente de antiguidade no Tribunal, ficando por último o presidente da Turma: votam os ministros Flávio Dino, Luiz Fux, a ministra Cármen Lúcia e, por fim, o ministro Cristiano Zanin. A decisão pela absolvição ou pela condenação é tomada por maioria de votos.

Caso haja condenação, o relator apresentará sua proposta de fixação das penas, e os demais ministros do colegiado também votarão nesse ponto.

Esta sequência está descrita no site do STF. Até aí, todos que acessaram o site já conhecem o rumo que o julgamento seguirá.

A questão que fica é: e depois do julgamento? E depois da condenação de Jair Bolsonaro?

Os cenários possíveis são extremamente movediços e exigirá dos políticos profissionais o arremesso de muitos balões de ensaios para testar a força dos ventos.

Para o lulismo, só há uma opção: a reeleição de Lula. Reeleito, terá quatro anos pela frente de lutas fraticidas e ataques constantes do bloco que assumir o espólio eleitoral de Jair Bolsonaro. Se tivesse preparado um sucessor e deixado o PT se arejar, o lulismo estaria mais confortável. Contudo, não arriscou. Bateu na mesma tecla e fez de tudo para administrar uma política morna ao ponto de parecer uma luta em que os dois pugilistas se estudam por horas a fio, até o juiz perder a paciência. Foi salvo pela inabilidade de Hugo Motta, de Trump e da família Bolsonaro.

Se não se reeleger, o PT entrará numa luta interna e seu campo de alianças deverá se reduzir drasticamente, ao menos num primeiro momento. Dificilmente teremos um governo de direita tão aloprado quanto foi o de Jair Bolsonaro, mas a direita brasileira nunca foi muito equilibrada e coesa, a despeito da máxima que afirma que quem se divide é a esquerda. Penso que a sorte do lulismo tem relação com os erros que o bolsonarismo cometer, mesmo o menos violento e desequilibrado emocionalmente.

Entretanto, os cenários mais complicados são os da direita.

O desastre completo para este campo será a reeleição de Lula tendo Tarcísio de Freitas como o opositor derrotado. Sem a Presidência e sem o comando do principal governo estadual do país, nem os cavalos brancos de Goiás, nem os ratinhos do Paraná salvarão a terra arrasada da extrema-direita ou a direita que gostaria de ser mais extremista. Possivelmente se abrirá um fosso que lembrará a tormenta que vive o PSDB. É esta possibilidade que faz muitos estrategistas de direita sugerirem que o governador Tarcísio fique pelas bandas dos bandeirantes.

Se Tarcísio de Freitas tentar a reeleição, o candidato que enfrentará Lula será um azarão. A direita dificilmente aposta num azarão, nem seus líderes políticos, nem os empresários que os financiam. Zema, Caiado, Ratinho, Eduardo Leite e a família Bolsonaro estarão em maus lençóis. Nenhum deles tem, hoje, cacife para competir com Lula. Será uma dança das cadeiras ao inverso, onde cada um deixará a cadeira para o outro se sentar.

O cenário mais auspicioso para a direita e extrema-direita é a vitória de Tarcísio de Freitas para a Presidência da República. Para ocorrer, a campanha eleitoral terá que ser avassaladora, possivelmente iniciada logo após o carnaval do próximo ano, já que nada acontece no Brasil antes desta data e a onda de lamentação pela prisão de Bolsonaro já terá se esgotado.

Uma campanha agressiva, atacando por todos os lados o governo Lula e a idade do próprio Presidente, passando por parentes e aliados, destacando seu relacionamento conflituoso com deputados e senadores e explorando a agruras dos prefeitos nos últimos anos poderá abrir caminho para se desenhar uma terra prometida pelo candidato de direita.

Já fica claro que uma campanha dessas precisa ser construída em 2025. Planejada nos mínimos detalhes e nadando em dinheiro. Precisa juntar gatos e lebres e forjar uma unidade que raramente se viu na direita brasileira. Precisa unir São Paulo e Minas Gerais, os três Estados do Sul e parte do Nordeste. Convenhamos que não se trata de uma tarefa simples cujo tempo disponível seja razoável para sua execução.

Vencendo, esta aliança cobrará cargos, recursos e projetos espalhados por todo território nacional. Novamente, um quebra-cabeças dos mais difíceis de montar. O Centrão cobrará recursos estilhaçados por toda topografia brasileira. Afinal, trata-se de uma mistura de ARENA com baixo-clero. A família Bolsonaro cobrará seu silêncio e apoio e os jovens políticos mais extremistas tentarão achar um caminho para atropelar os cabelos brancos da direita. Não será nada fácil.

O bolsonarismo fez todo campo político brasileiro se tornar inseguro e desestruturado. Fez de Lula um líder cauteloso. Lula caminhou para o centro. O Centrão, até então fiel da balança, passou a correr de um lado para outro e revelou muitas de suas fragilidades, ainda mais tendo Hugo Motta na presidência da Câmara de Deputados.

Os próximos anos não serão fáceis e veremos a reacomodação das peças políticas. Será uma nova versão das tragédias gregas.

  • Imagem gerada a partir de IA

Escrito por:

Rudá Ricci, sociólogo, mestre em ciência política e doutor em ciências sociais. Ex-consultor da ONU e presidente do Instituto Cultiva. Autor, dentre outros livros, de "Desafios do Educador" (Editora Letramento) e "Fascismo Brasileiro" (Editora Kotter)

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