
As chances perdidas por Lula e Bolsonaro
Um político mediano, com uma inteligência básica, poderia ter massacrado o adversário no último bloco do debate na Bandeirantes.
Foi quando Lula administrou mal seu tempo e deixou Bolsonaro com quase seis minutos, sem direito a intervenções, no último bloco de enfrentamento direto. E o medíocre Bolsonaro só disse besteiras.
Seis minutos, uma eternidade em quaisquer circunstâncias hoje, foram desperdiçados pelo sujeito que Lula não pode chamar de pedófilo, por decisão de Alexandre de Moraes.
Seis minutos em que Bolsonaro conseguiu repetir as mesmas acusações (religião, família, banheiro unissex) contra Lula, misturando os assuntos caseiros com divagações sobre a Nicarágua.
Os seis minutos que Bolsonaro poderia ter usado para emparedar Lula foram gastos com conversas antigas para o mesmo público que ele já conquistou.
Bolsonaro poderia ter dedicado pelo menos metade do tempo aos nordestinos. Poderia ter falado aos pobres. E poderia ter tentado conquistar o voto das mulheres.
Nada disso. O sujeito falou para os convertidos, jogando fora os minutos oferecidos pela barbeiragem de Lula.
Um resumo do debate poderia ter as seguintes conclusões. Não houve erros graves de nenhum lado. E os dois não correram riscos.
Lula colocou Bolsonaro contra a parede, na primeira parte, ao mostrá-lo como despreparado e criminoso nos ‘cuidados’ contra a pandemia.
E Bolsonaro inverteu as posições, ao manter Lula sob questionamento sobre corrupção, na segunda metade.
Por erro de avaliação da assessoria ou por voluntarismo de Lula, os crimes da facção criminosa da família Bolsonaro foram pouco explorados.
Lula não soube usar o recurso da pergunta para manter Bolsonaro se explicando.
Foram superficiais as abordagens de Lula sobre milicianos, garimpeiros, grileiros e desmatadores da Amazônia e sobre a relação da bandidagem da floresta com Bolsonaro.
Mas o resultado pode ter sido o que favorece Lula: um empate, que a grande imprensa pode transformar em vitória de Bolsonaro, por causa dos ataques sobre corrupção.
Considerando-se o fim de semana de terror, depois do vídeo sobre as menininhas venezuelanas, Bolsonaro pode até comemorar. O assunto apareceu por poucos segundos e sem profundidade.
Lula não poderia ter explorado o escândalo, com cutucadas eventuais, para deixar Bolsonaro inseguro? Havia o temor de passar arrogância ou de mexer em tema tão delicado, que deve ficar entregue apenas a André Janones?
Por que, quando Bolsonaro trouxe, por conta e risco, o assunto ao debate, Lula não respondeu que essa é agora uma questão grave a ser examinada pela polícia, pelo Ministério Público e pela Justiça?
Será que Lula não foi cordial e republicano demais com o sujeito que faz lives de madrugada para se explicar sobre encontros com crianças?
Será que mais uma vez Lula não pegou leve com o sujeito que ainda precisa explicar a história do clima com as menininhas?
Sim, sabemos que Lula não poderia chamá-lo de pedófilo, nem deveria, mas poderia ter inquietado o sujeito.
O cara que não pode ser chamado de pedófilo escapou do principal assunto da campanha no segundo turno e ainda e ficou falando da Nicarágua.
O escândalo das crianças venezuelanas será esquecido?