Presidente da República com as chaves da Câmara no bolso. O que virá?

1 de fevereiro de 2021, 23:54

Com a vitória do deputado Arthur Lira (PP-AL) como novo presidente da Câmara os Deputados, o Legislativo brasileiro acaba comprometido em sua missão de poder autônomo e independente. A partir de agora, o Legislativo entra numa fase de dúvidas sobre o seu papel de fiscalizador dos atos do Executivo, que passa a ser o seu verdadeiro mentor. Para o tenente reformado do Exército que, no momento (e agora, com mais tranquilidade), ocupa a presidência da Nação, o resultado da eleição significa que as chaves do parlamento nacional, pelo menos da Câmara, estão à sua disposição.

Artur Lira representou, neste pleito, os interesses do Palácio do Planalto em sua sanha autoritária de domínio total, de controle amplo e definitivo sobre a vida nacional. Sabe-se lá o que pode acontecer a partir de agora com a frágil Democracia brasileira. Além da pauta política e econômica do governo, a partir de hoje encaminhada com mais conforto pelo governo, o risco de uma agenda de implantação de um sistema duro de repressão às liberdades democráticas passa a ser mais real. O autoritarismo de Estado deixa de ser um sonho bolsonarista e se transforma, com cores plúmbeas, em um pesadelo para toda a sociedade.

Foram perdidas 62 chances de se abrir processo de impeachment contra o presidente da República, o que teria colocado um freio nessa marcha rumo ao controle total de tudo pelo Executivo. O antecessor de Lira, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), deixa a presidência da Câmara de maneira melancólica. A História lhe reservará lugar inglório, o de maior engavetador de pedidos legítimos de afastamento de um presidente do Brasil que tinha contra si todos os motivos para ser escorraçado do comando do País. Motivos políticos, econômicos, sanitários, humanitários, comportamentais, de corrupção, de ameaças que, agora, ficam mais fáceis de concretizar.

Sem nenhuma certeza de estar se colocando na presidência da Casa uma figura que representasse um combate firme ao bolsonarismo, a candidatura de Baleia Rossi significava, ao menos, uma leve esperança de independência do Legislativo. Talvez até a aceitação de um dos pedidos de impeachment e a possibilidade de se lutar, da tribuna, contra o pior que, a partir de hoje, se vislumbra como dura realidade que é a presidência de um poder como apêndice da presidência de outro.

Não se pode entregar os pontos e deixar tudo de mão beijada para o presidente da República. Nem se vai, naturalmente. Mas, que a luta será desigual com Arthur Lira presidindo da Câmara em linha direta com o Palácio do Planalto, isto será. A primeira medida tomada por Lira, na bucha, dissolvendo o bloco de oposição que apoiou o seu concorrente e zerando o processo de distribuição de cargos na mesa diretora da Câmara, mostra o estilo com que o novo presidente da Casa vai se comportar em sua passagem pelo cargo. O jogo será duro.

Não é à toa a festa feita pelo bolsonarismo ao fim da votação, com 302 votos e ainda em primeiro turno. Até mesmo antes, vide a sessão de louvor etílico que a bancada evangélica promoveu, antecipando a vitória do seu ungido, a base de uísque 12 anos. A reviravolta moral e de costumes, guinando radicalmente à direita, também se prenuncia nessa nova era do bolsonarismo.

Com as mãos e os pés cravados na Câmara dos Deputados, o presidente da República tem motivos de sobra para comemorar a eleição do seu aliado e pupilo. O Brasil, não. Pelo contrário.

Escrito por:

Jornalista e compositor, com passagem por veículos como o Jornal do Commercio (PE) e as sucursais de O Globo, Jornal do Brasil e Abril/Veja. Teve colunas no JC, onde foi editor de Política e Informática, além de Gerente Executivo do portal do Sistema JC. Foi comentarista político da TV Globo NE e correspondente da Rádio suíça Internacional no Recife. Pelo JC, ganhou 3 Prêmios Esso. Como publicitário e assessor, atuou em diversas campanhas políticas, desde 1982. Foi secretário municipal de Comunicação. Como escritor tem dois livros publicados: "Bodas de Frevo", com a trajetória do grupo musical Quinteto Violado; e "Onde Está Meu Filho?", em coautoria, com a saga da família de Fernando Santa Cruz, preso e desaparecido político desde 1973. Como compositor tem dois CDs autorais e possui gravações em outros 27 CDs, além de um acervo de mais de 360 canções com mais de 40 músicos parceiros.

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