Extrema direita local surfa na marola criada por premiê de Israel para articular comício do dia 25
Fora da luta política, não há sentido na estridência com que setores da mídia tradicional brasileira abandonem a fantasia de democratas equilibrados com a qual se travestem para aderir sem vergonha ou subterfúgios ao mais raso, distorcido e estratégico discurso da extrema direita ora em voga: condenar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pela correta, precisa e oportuna qualificação da matança de mais de 30 mil palestinos na Faixa de Gaza e na Cisjordânia como genocídio e traçar o paralelo com as ações abjetas, desumanas e genocidas promovidas por Adolf Hitler e pelo Exército nazista contra o povo judeu no curso da 2ª Guerra Mundial.
A inspiração original que fez Hitler passar à História como um facínora e paradigma da incivilidade é a mesma inspiração que move o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu. A ação do carniceiro de Gaza e de Rafah, na atualidade, só é menor que a do assassino alemão, no século passado, em escala. Ambos querem destruir um povo ao qual se recusam a reconhecer o direito de formar um Estado-Nação e desprezam suas crenças e mitos religiosos, aproveitando o argumento para pôr em curso o expansionismo territorial. No caso de Hitler, a ambição era esmagar a Europa. Netanyahu, por sua vez, pretende tão-somente anexar os territórios palestinos remanescentes – a área onde tentam sobreviver os descendentes dos ocupantes originários daquela região, desde os templos bíblicos.
No auge de sua estratégia insana, o genocida alemão criou o modelo de campos de concentração e de conversão de áreas urbanas em guetos onde animalizava os judeus antes de matá-los. No curso dessa guerra assimétrica que se desenvolve no Oriente Médio, onde um Exército armado até os dentes e com forte colaboração de outras potências globais emprega força e tática desmedidas para chacinar crianças, velhos, mulheres e civis em geral enquanto finge caçar seus inimigos reais – os terroristas do Hamas -, o genocida que se esconde em Tel Aviv mata doentes e feridos em hospitais, lança bombas em campos de refugiados e em escolas, deixa o povo palestino morrer de fome e de sede cortando-lhes linhas de abastecimento e transformando em novos guetos (dessa vez, como judeus travestidos de porteiros das “Auschwitzes” em que degradam e desumanizam todo um povo que um dia almejou ser Estado-Nação.
O presidente brasileiro, Lula, na condição de um dos porta-vozes desse novo pólo gravitacional de poder, o Sul Global, foi o primeiro líder de expressão do mundo democrático a definir o genocídio promovido pelo Exército de Netanyahu na Faixa de Gaza e na Cisjordânia com a força do parâmetro preciso que a infâmia e a boçalidade têm. Afinal, crueldade e desumanidade semelhantes às empregadas pelas tropas do premiê judeu no Oriente Médio só se viu quando Hitler fazia com que a Whermacht aniquilasse o povo judeu.
Declarações do Governo de Israel contra Lula unem a extrema-direita local. Malafaia e Conib catalisam eco e articulam presença na Avenida Paulista
Na esteira da estrepitosa reação do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, às declarações conjunturais de Lula sobre o genocídio de palestinos em Gaza e Rafah, lideranças de extrema-direita no Brasil alvoroçaram-se. Já na noite do último domingo, o empresário da má-fé, Silas Malafaia, enxergou na crise diplomática criada entre as chancelarias de Brasil e Israel uma oportunidade para dividir com associações judaicas igualmente extremistas – a Confederação Israelita Brasileira, Conib, por que não?, pensou – o custo de organização do comício de apoio a Jair Bolsonaro e de rejeição às instituições republicanas convocado para o próximo domingo, 25 de fevereiro, na avenida Paulista.
No ecossistema de perfis de redes sociais, aplicativos de mensagens, sites e blogs de extrema-direita, neste momento, promove-se um alinhamento nada silencioso das críticas a Lula (com ventríloquos de sionistas fazendo eco a Netanyahu) a fim de converter os maus bofes do premiê israelense numa espécie de “repúdio” do mundo inteiro ao presidente brasileiro.
Antes de seguir, assevere-se: nenhum outro Estado, Governo ou chancelaria condenou, até o início da tarde da segunda-feira, 19 de fevereiro, o posicionamento de Lula. A desmedida relevância à manobra tosca de auto-resgate de Israel do atoleiro em Gaza e Rafah promovida por Benjamin Netanyahu só reverberou em território nacional – lá e cá. Aqui, unindo as gargantas profundas e histriônicas da extrema-direita com as vozes engomadinhas e falsamente democráticas e intelectualmente desonestas da mídia tradicional brasileira.
Enquanto as ondas de reverberação desmedida do repúdio desequilibrado do premiê de Israel a um declaração factualmente incontestável do presidente brasileiro ocupam manchetes de sites jornalísticos e minutagem nos comentários dos canais de TV aberta e por assinatura, abaixo da linha d’água da camada democrática da sociedade brasileira a extrema-direita se alia à capacidade de organização das denominações neopentecostais que ainda escutam os apelos boçais de Silas Malafaia. Juntos, buscam apoio financeiro, pecuniário, dos empresários e altos executivos judeus ou de origem judaica que se sentem representados pela Conib. Se perfilarem unidos na Paulista, no próximo domingo, todos juntos e misturados em apoio a Bolsonaro e determinados a esconjurar o Estado Democrático de Direito, não há quem não possa dizer: será a perfeita união galvanizada de excrescências.
Este artigo é de responsabilidade do colunista.