Ou impeachmen ou bloco na rua já

8 de fevereiro de 2021, 14:24

Na véspera da eleição da Câmara dos Deputados, ao saber-se traído por ACM Neto – presidente do seu partido (DEM) e que acabara de jogar-se nos braços de Bolsonaro -, Rodrigo Maia, a um passo de sair do posto de presidente da casa para entrar na história como alguém que se recusou a fazê-la, deu um faniquito. Esbravejava que, agora, sim, no último minuto do segundo tempo entraria com um pedido de impeachment. Não o fez. Recebeu um recado enérgico do “mercado” para deixar tudo como estava. Miúdo, enxugou as lágrimas e engatinhou para fora do cargo.

Estava dada a senha para os demais segmentos liberais. Com o Congresso nas mãos de “aliados” dispostos a barrar os absurdos de Bolsonaro, ou aprovar os projetos convenientes a eles, o mercado, o empresariado, a mídia e demais adeptos da teoria do estado mínimo, a melhor opção seria deixá-lo “evoluir” como presidente até 2022, enquanto buscam desesperadamente um personagem para investir do cargo de “candidato” direitista de centro-direita. Daí o artigo lamuriento, conservador (no que há de pior no termo) pragmático e comodista de Fernando Henrique Cardoso, do final de semana, e a capa daquela revista que perdeu qualquer sentido de brasilidade.

Ambos defenderam de maneira irresponsável e cruel a permanência daquele que não está nem aí para as 230 mil vidas perdidas na pandemia que se recusou a combater e, pelo contrário, incentivou, apostando no contágio de rebanho, que a seu ver seria útil para a economia, para a folha da Previdência, para eliminar pretos e pobres, enfim, para um verdadeiro trabalho de “eugenia” no país.

Afinal, Bolsonaro – auxiliado por Michel, não nos esqueçamos quem abriu o caminho da destruição – conseguiu em curto espaço de tempo avançar com “reformas” de interesse dos ricos e donos de negócios. E se não avançou na medida em que esperavam, vide o programa de privatizações, pelo menos estruturou projetos para fazer isto, nos moldes que esses senhores apostam. Um peteleco e elas sairão do papel, a reforma tributária, a reforma administrativa e o arremate da Eletrobras, imaginam. (Ou torcem).

Do outro lado, o dos progressistas, a derrota no Congresso desceu grossa na garganta. Sabem que lá é o palco onde tudo acontece. Para o bem ou para o mal. O jogo é bruto.

Observando em reservado silêncio o desenrolar dos acontecimentos, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu agir. Há dois anos coleciona “discursos” do ministro do STF, Gilmar Mendes, em favor de que lhe façam justiça. Gilmar fala, mas não tira o rabo de cima do seu pedido de habeas corpus, um instrumento jurídico de urgência, pois de interesse do réu e seus direitos em favor da liberdade.

Agora que a figura de Moro – tanto do ponto de vista doméstico, já que divide o teto com a sua advogada -, tanto como figura pública, está depauperada, depois do vazamento das suas conversas pouco ortodoxas com os promotores de Curitiba, Lula está a um passo de ser inocentado. Sentiu, no entanto, que a distância entre esta decisão e a de conseguir de volta os seus direitos políticos se alarga. Não por conta de provas, que abundam, mas pela pressão social para que isto não aconteça. Volto a Paulo Cesar Pinheiro e seu verso hiper atual: “que medo você tem de nós/ olha aí” …

Com um senso político aguçado, Lula percebeu haver um vazio de discurso no campo progressista. Ou melhor, há um samba de uma nota só: “precisamos nos unir, precisamos de um projeto, precisamos apresentar um discurso atraente para a opinião pública, precisamos ter um candidato capaz de barrar Bolsonaro e colou “o bloco na rua”.

Dois anos é tempo demais para continuarmos a aceitar a marcha para a destruição. É tempo de menos para quem não se organizou para derrubá-lo e se conformou em jogar o jogo de uma eleição que está no horizonte, mas não se sabe em que moldes. Faltou a exata compreensão de que não vivemos tempos normais. Houve um golpe com o qual as lideranças tentam se adaptar e conviver. Em tempos de golpe a postura é de resistência. E resistência não há. Há arranjos.

Ao lançar Fernando Haddad como candidato para as eleições vindouras (?), Lula buscou preencher este vazio. Logo se viu assanhar o fogo amigo. Reações inesperadas do tipo: “não se discute nomes, mas projeto”, foram ouvidas. Ora, roa, ora, meus senhores. Quanto tempo mais o campo progressista vai querer esperar e assistir o monólogo que acontece na sociedade? Quanto tempo mais vão adiar a tal reunião para o tão prometido diálogo e formatação do projeto de país? O PT tem um projeto testado e pronto para ser ampliado, para o Brasil.

Por onde começa o diálogo? Com a cláusula de barreira imposta aos partidos, até Renan Calheiros já fala como candidato (MDB).  Cada um continua a puxar a brasa para a sua sardinha como se não houvesse um Bolsonaro a ser derrotado. Como não se organizam e não apresentam o tal “projeto”, Bolsonaro cresce em seus arroubos e o Brasil ouve um lado só. Querem um projeto? Sentem e dialoguem, e discutam, e formulem. Qualquer coisa em contrário é embaralhamento do jogo. É deixar que prosperem as teses bolsonaristas, as fake news, a volúpia do mercado, que tenta evitar o impeachment.

A regra é clara e está prevista na Constituição. Havendo crime, troca-se o governante por meio dele. (E não me venham falar em ingenuidade. Estamos tratando de lei, e não de conveniências políticas). Criar as condições políticas para que ele aconteça depende de a proposta do pedido existir. Aí, sim, a discussão no Congresso se acentua, transborda para as ruas e não havendo ruas – por conta da pandemia – para as carreatas ou panelaços. Que ecoem as “tramontinas” da classe média. Que ronquem os motores dos insatisfeitos. Ou, não havendo impeachment, a hora é, sim, de botar o bloco na rua.

Escrito por:

Jornalista. Passou pelos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora-pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" e "Imaculada", membro do Jornalistas pela Democracia

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