Arthur Lira (Foto: Reprodução/Twitter)

Não há espaço para omissão do presidente da Câmara, quando a democracia está ameaçada

28 de julho de 2022, 15:51

A pesquisa Datafolha a ser publicada hoje (28/07), no final do dia, traz um dado importante. No centro, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem 40%, o ex-ministro Ciro Gomes tem 19% e o atual ocupante do cargo, 14%. O dado reflete a movimentação dos últimos tempos de Bolsonaro que, a partir do evento onde reuniu 40 embaixadores estrangeiros no Planalto para dizer ao mundo que pretendia dar um golpe e criticar sem provas ou fundamentos técnicos, o sistema eleitoral brasileiro, deixou à mostra todo o seu radicalismo e a intenção de se perpetuar no poder. Tradução: pôr fim à democracia.

Foi o seu momento de inflexão. Ali, selou o rompimento com o segmento da sociedade que ainda tolerava as suas grosserias, a sua pauta canhestra e retrógrada de costumes e o seu declarado pendor pelas armas e a violência, em nome de uma economia “liberal” que nem sequer pode ser chamada assim, pois tampouco o que prometeu foi entregue.  

Entre um país falido e faminto, sob o risco de um forte retrocesso, parte significativa da elite que se colocava ao seu lado se arredou para o centro, capitulou. Não marcharão para a aventura golpista com Bolsonaro e é isto que a pesquisa está a nos contar.

Nem era preciso. No início dessa semana, o manifesto “Carta aos Brasileiros”, que começou com três mil assinaturas e já conta com algo próximo de 200 mil – podendo já esse número estar ultrapassado agora, quando este texto é escrito – foi o marco entre o silêncio cúmplice, mantido até o momento, e o brado de “chega!”, por parte do tal “mercado”, empresariado, banqueiros, intelectuais e todas as parcelas que contam nesse país. Não dirão nem para o próprio espelho que votarão em Lula, mas se não estão com Bolsonaro, a opção no segundo turno não é “uma escolha difícil”. É Lula.

De pouco ou nada adiantou o encontro do presidente do partido de Bolsonaro (PL), Valdemar Costa Neto, com o presidente do TSE, o ministro Edson Fachin, em que fez juras de conciliação e redução dos gritos do ocupante do Planalto. O STE, o STF, o mundo, as lideranças de todos os cantos sabem que dentro de Bolsonaro mora um demônio e um projeto, que o dominam, tornando-o indomável, inadministrável, incontrolável. Não há conversa por procuração que dê jeito no seu sonho de retornar com um regime algo próximo do que foi a ditadura (1964/1985).

O que a pesquisa mostrou foi o movimento de retorno à razão, dos que ainda se encontravam tal como cracas de mexilhões, agarrados à proa do navio bolsonarista.  

A cena patética, humilhante e desabonadora de ver um presidente difamar o próprio país aos olhos externos foi a gota de óleo de peroba que faltava para que sentissem, finalmente, vergonha de estar do lado de uma história que tem tudo para acabar mal.  

Para os que duvidam, basta observar que, depois de nove dias de incubação, até o (infelizmente) presidente da Câmara, Arthur Lira, depois de vestir o azul da camisa de lançamento da candidatura de Bolsonaro para ver se a sorte mudava, veio a público, finalmente, se posicionar. Disse que: “A Câmara dos Deputados fala quando é necessário falar, não quando querem obrigá-la a falar. Eu dei mais de 20 mensagens mundo afora e internas no Brasil de que sempre fui a favor da democracia e de eleições transparentes e confio no sistema eleitoral”.  

Falso. Ao envergar a camisa de Bolsonaro e ir para a linha de frente do palco da convenção que o lançou para o cargo de presidente da República, Lira endossou o recém acontecido ato vergonhoso de difamação do sistema eleitoral e a sua ameaça golpista. Assinou embaixo as críticas do “parceiro”. E, pior, se omitiu.  

Não é verdade que o presidente da Câmara fala quando quer. O cidadão Arthur Lira fala quando quiser. De preferência, não muito, pois não estamos interessados nos seus resmungos, mentiras e desculpas esfarrapadas. Quanto ao presidente da Câmara, como titular da casa que representa o povo, Lira tem que se pronunciar todas as vezes que o nosso direito está ameaçado. E estamos ali, no limiar entre o dia e a noite. Não há lugar em cima do muro para alguém que se investiu do cargo de presidente do poder Legislativo. Sob pena da nossa democracia morrer, assassinada por sua omissão.

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Escrito por:

Jornalista. Passou pelos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora-pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" e "Imaculada", membro do Jornalistas pela Democracia

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