Brasília – O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, após reunião com a presidente do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, fala à imprensa (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

País jovem procura: moreno alto, bonito e liberal…

11 de novembro de 2020, 13:09

Em um país de “maricas”, o grande nó do momento é encontrar um bom partido – não, não se trata de partido político. Ou melhor, também -, para contrair futuro compromisso. Exige-se do candidato “boa aparência”, “bons modos”, discurso “moderado”, não importando que suas ações futuras tendam para a direita convicta, ao longo do relacionamento.

O arremedo de anúncio de “classificado” acima, busca salvar a honra de um Brasil em um dos seus momentos de maior indigência. Quer seja do ponto de vista interno, como externo. O último item, conforme já disse o chanceler de plantão, não tem tanta importância. Melhor ser pária do que “esquerdopata”, ele considera, em tempos de derrota do seu “Deus” salvador, conforme artigo publicado antes de assumir o cargo. O que nem de longe significa ter abdicado dessa “crença”. Muito pelo contrário. Basta ver o seu silêncio frente à crise que o seu “Deus” enfrenta lá fora.

Internamente, tendo a concordar – e eu que jurei não dizer isto jamais –, com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Ele escreveu em seu Twitter: entre “pólvora, maricas e o risco à hiperinflação, temos mais de 160 mil mortos no país, uma economia frágil e um estado às escuras”, referindo-se ao Amapá.

A concordância para por aí. A referência de Bolsonaro ao uso da pólvora contra as ogivas nucleares e os “marines” americanos foi uma oportunidade oferecida por Maia, ao barrar dezenas de pedidos de impeachment, em momento propício, quando havia ruas, fragilidade nas pesquisas e fartos indicativos de “crimes de responsabilidade” cometido pelo autor da frase em questão. Tivesse Maia cortado as suas asinhas concedendo ao povo e ao Congresso julgar as suas faltas de decoro, atentados à Constituição, arroubos autoritários contra o STF e outras modalidades, e não precisaríamos ver mais uma vez o país virar piada internacional. Mas, como diria Polyana menina (Martin Claret, 1913), melhor ouvir isto, que ser surdo…

Estaria Rodrigo Maia incluso ou não, no adjetivo homofóbico e rude: “maricas”? A julgar pelas atitudes de extrema tibieza, os preconceituosos de plantão diriam que sim. Mas, neste espaço, não cabe esse tipo de julgamento. Deixe isto para os amarelinhos, incansáveis em ataques contra o presidente da Câmara. Resiliente, ele só faltou perguntar: “E daí?”.

Sobre o risco de hiperinflação, este é assunto com o qual Maia tem total intimidade. Não foi ele quem lutou feito um gatinho feroz para aprovar a reforma da Previdência? Um dos motivos – apontava -, era a retomada da economia, o reforço ao orçamento da União, e o banimento do perigo da fragilidade econômica e, por consequência, a volta da inflação. Foi o que defendeu na época. Do mesmo modo, postou-se a favor do teto de gastos e o defende com unhas e dentes, sem medir consequências sociais e econômicas.

Quanto ao escuro, melhor não ter medo. Ele faz parte do pacote de privatizações que as suas teorias liberais defendem como solução para todos os males. Vai daí, que sem o estado presente, quando se vende empresas de setores estratégicos, não há fiscalização. Resultado: apagão. E olha que os seus “mentores” já viveram isto lá pelo início dos anos de 2000. Ele não aprendeu? Talvez fosse muito jovem para isto…

E, por fim, vamos falar dos 162.842 mil mortos. Ficou bonita a sua mensagem aos familiares das vítimas. Bastante sensível. “Em nome da Câmara dos Deputados, reafirmo o nosso compromisso com a vacina, a independência dos órgãos reguladores e com a responsabilidade fiscal”, disse. “E a todos os parentes e amigos de vítimas da Covid-19 a nossa solidariedade”. Mandou bem.

Porém, ao preservar no cargo um presidente negacionista, adepto da cloroquina, dos rostos sem máscaras – despejando perdigotos contaminados sobre os interlocutores – e contra o isolamento social, o senhor não teria contribuído de maneira efetiva para os óbitos?

Ao conciliar nos confortáveis sofás do Planalto com as manobras de Bolsonaro para aliviar malfeitos dos seus ministros e filhinhos, a fim de mantê-lo firme, o senhor não teria se postado também contra as vítimas e o direito à vida? E a sua resistência à criação do imposto sobre grandes fortunas? E o seu ranger de dentes diante da possibilidade de esticar o orçamento de guerra para possibilitar a continuidade do auxílio emergencial, criado graças à luta da oposição, pelos desvalidos?

O senhor conhece bem o caminho correto das coisas, mas, tal como a Chapeuzinho Vermelho, às vezes pega o trajeto frequentado pelo Lobo Mau, embora suas notas no Twitter nos falem da sua visão acertada sobre o cenário. Recusar o ex-juiz Sergio Moro como pretendente porque ele é “ultradireita”, por exemplo, cai bem ao seu figurino. Contraria à direita fofa, mas, logo o senhor se ajeita e procura um afago, um cafuné, para acalmá-la. Suas ações são todas premeditadas e “convenientes”. Afinal, há uma vaga de vice na chapa de Luciano Huck. E, assim, mesmo sabendo que não se encaixa às exigências do classificado, pois não é nem moreno, tampouco é alto, segue fazendo o jogo da plateia. Vai que cola…

Escrito por:

Jornalista. Passou pelos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora-pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" e "Imaculada", membro do Jornalistas pela Democracia

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