Jair Bolsonaro (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Welcome, mister presidente!

24 de março de 2023, 22:20

Bolsonaro está de volta. Com o ar mais cândido que a cara-de-pau pode permitir a alguém, o ex-ministro Ciro Nogueira anunciou, nesta semana, em entrevista ao vivo – sem corar! –, que o seu ex-presidente retorna ao país na próxima quinta-feira, (dia 30), em viagem de classe econômica. A data, segundo revelou, foi escolhida em função do “preço”, mais barato das passagens, “porque o presidente é um homem simples”.

Do lado de cá da tela houve esforço para apurar os ouvidos, pois estava difícil entender ou mesmo acreditar. Basta lembrar que, há um dia, joias no valor de R$ 800 mil e armas ofertadas pelo governo dos Emirados Árabes, tiveram de ser arrancadas das suas mãos por ordem do TCU. Do contrário, estariam adornando os seus pulsos – abotoaduras cravejadas e relógio de ouro, com pulseira de couro de jacaré – pobre animal! E desnecessário se faz mencionar os reluzentes diamantes no valor de R$ 16,5 milhões, motivo de mais de oito incursões para reavê-los no cofre da receita Federal, antes da fuga para a Disney.

É possível que o motivo da escolha da data da volta seja outro. Desde o final do governo do ex-presidente Fernado Henrique Cardoso, quando foi instituída a reeleição, que nunca jamais em tempo algum, alguém que ocupou a cadeira da presidência deixou de ser reeleito. Talvez por isto, o Decreto nº 6.381, de fevereiro de 2008, que trata dos direitos dos ex-presidentes, não prevê nem detalhe um “plano de fuga do país”, ou mesmo “férias prolongadas” com toda a entourage do derrotado, sendo pagas por mim, por vocês, e até mesmo por eles, o seu núcleo de fanáticos.

A escolha da data, a bem da verdade, tem a ver com o fato do seu “pior pesadelo”, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, não estar em terras nacionais para vê-lo desfilar suas malas rumo ao novo endereço civil. Lula estará em viagem à China, nosso principal parceiro comercial, para onde frigoríficos brasileiros exportam 60% da carne consumida naquele país. Assim, Bolsonaro poderá chegar com todo o constrangimento que não quis encarar no day after das eleições. E, ainda, a tempo de fazer alguma graça com os rebeldes de pijama do Clube Militar, no 31 de março.

De acordo com levantamento da Folha, em 15/02, a viagem do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para os Estados Unidos nos últimos dias de seu mandato custou ao menos R$ 950 mil aos cofres públicos, até o início de fevereiro. “O valor inclui dados repassados pelo Ministério das Relações Exteriores após pedido de LAI (Lei de Acesso à Informação) e informações do Portal da Transparência”, esclarece o jornal. “Do total, R$ 667,5 mil envolvem diárias, hospedagens, aluguel de veículos e intérpretes, entre outras despesas, de quando Bolsonaro ainda era presidente. Ou seja, do dia 28 de dezembro, quando os primeiros servidores foram em missão precursora até os EUA, até 31 de dezembro”, detalha. Outros R$ 271 mil foram pagos em diárias para os assessores que ficaram com Bolsonaro após ele deixar a Presidência.

A lei, que não projetou, como dito acima, nem férias nem fugas, devendo, portanto, ser aplicada ao seu caso, determina que a permanência de Bolsonaro nos Estados Unidos, mesmo na condição de ex-presidente, seja bancada pelos cofres públicos. Com o agravante que como os servidores não moram em Orlando, onde se encontra desde o fim do mandato, eles recebem diárias além dos respectivos salários. Como ainda era presidente da República, Bolsonaro se beneficiou até 1º de janeiro de todas as prerrogativas do cargo para realizar a viagem aos Estados Unidos.

Quem mais recebeu em diárias foi Sergio Cordeiro, que já embolsou R$ 73,6 mil. Em seguida vem Marcelo Câmara, com R$ 69 mil, e Max Guilherme, com R$ 64,5 mil em diárias. Ricardo Dias e Osmar Crivelatti receberam cada um R$ 32,1 mil. Uma farra. E, ainda de acordo com a Folha, a conta não inclui gastos com o voo para os EUA, no avião da FAB (Força Aérea Brasileira). E, felizmente, tampouco gasto com as passagens de retorno.

A fuga para os EUA foi estratégica. Não teve de exibir para o sucessor a sua cara de derrotado, em cerimônia da passagem da faixa presidencial. Em compensação, viu crescer a paranoia com relação à prisão.

Talvez numa contabilidade mental das tantas que aprontou, Bolsonaro pode ter deixado crescer dentro dele todo o assombro dos que sabem que devem. Entre uma aparição pública e outra, na terra do Mickey, deixou escapar frases como: “posso ser preso a qualquer momento”. Em vários posts dos filhos nas redes sociais, apareceu chorando de pavor. Precipitou-se. Como já disse o grande criminalista, Kakay, não vale a pena trancafiá-lo agora. Há muitos testemunhos ainda para desfiar histórias a seu respeito, adensando os vários processos que já tramitam.

O seu retorno movimentará o cenário político. As suas tiradas grotescas serão um incômodo a mais para Lula. Mas, pode ser que, de volta, concretize par a sua malta, de uma vez por todas, o seu papel de ex. E, ao contrário do que disse o 01, isto não o tornará maior nem mais forte. Apenas o que ele de fato é: um ex-presidente com 700 mil mortes no currículo, ameaçado pelos tribunais internacionais – ainda que em processos longos – e sobressaltado todas as noites. Bolsonaro vai viver à espera do oficial de Justiça que um dia baterá à sua porta para dizer: “o senhor está preso”. Como não sabe dia nem hora, este, sim, será o seu “pior pesadelo”. Welcome, mister presidente!

Escrito por:

Jornalista. Passou pelos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora-pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" e "Imaculada", membro do Jornalistas pela Democracia

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